A criação dessa Reserva Garimpeira do Tapajós, pela Portaria N º 882, de 1983, teve como verdadeiro pano de fundo, definir uma área exclusiva para a atividade de garimpagem, para servir como “Mata Borrão Social” de mais de cem mil garimpeiros de serra Pelada (PA), Ariquemes (RO), São Félix do Xingu, entre outras províncias auríferas e estaníferas que estavam sendo repassados os direitos minerários para grandes empresas nacionais e, principalmente, multinacionais.
Qual será o destino de milhões de famílias amazônidas? Para as cidades esses homens de bem não votarão. Como o Estado não implanta mecanismos indutores de outras economias, é pouco provável que o desenvolvimento dessas regiões, já com fracos indicadores socioeconômicos, possa ocorrer espontaneamente.
Nos promove arrepios, quando observamos nossas fronteiras panamazônicas, atualmente, atraindo uma sociedade legionária, sem bandeira e sem comando. Se o Brasil não acordar e procurar ordenar, e controlar essas atividades de uso das riquezas ambientais na grande floresta, em duas décadas, a Amazônia rural, estará bastante desabitada o que promoverá uma sedução de Grandes Potências Globais, a se submeterem a “um novo comando climático ou em defesa de outros princípios”, para sua efetiva ocupação fática, em defesa da patrimonialização planetária. Na Antarctica, isso já foi efetivado. Agora estão rumo à Amazônia – uma Antártica verde, ainda habitada com 29 milhões de brasileiros.
A Guerra contra a atividade garimpeira tradicional é na verdade uma guerra contra o Brasil, contra a nossa soberania e direitos às riquezas da Amazônia. O MOVIMENTO GARIMPEIRO POVO TRADICIONAL – MGPT, reuniu milhares de garimpeiros tradicionais, políticos e cidadãos do Vale do Tapajós, e apresentaram a Carta do Tapajós com sugestões, críticas e propostas para o ordenamento social, legal e ambiental das atividades tradicionais garimpeiras.
Passo a reproduzir o documento do: “MOVIMENTO GARIMPEIRO POVO TRADICIONAL – MGPT. CARTA DO TAPAJÓS – Itaituba – Pará ,14 de abril de 2023
Apresentação e sugestões do MGPT para audiência pública da ALEPA na região do tapajós dia 14 de abril de 2023 que será realizada no município de Itaituba.
Esta manifestação resume parte de nossas angústias que endereçamos às autoridades aqui presentes, toda a sociedade tradicional garimpeira bem como à população da Terra do Meio e Província Garimpeira do Tapajós com especial respeito aos brasileiros presentes nesta audiência pública.
Meu objetivo aqui hoje é apresentar o MOVIMENTO GARIMPEIRO POVO TRADICIONAL e nossos projetos de regularização da atividade garimpeira como ela é, na realidade, não como pessoas de fora da atividade garimpeira querem que ela seja, sempre com proteção, respeito ao meio ambiente, cuidando das pessoas e garantindo a economia de mais de 300 mil pessoas no estado do Pará.
O MGPT Movimento Garimpeiro Povo Tradicional (MGPT) todos nós sabemos que o povo garimpeiro tem direito tradicional e constitucional ao uso social dos bens minerais que estão garantido na constituição federal nos artigos 21, 174, 201 e 215, porém acho que poucos sabem a diferença entre a atividade garimpeira e a mineração, sim meus amigos são duas atividades diferentes e isso não sou eu quem diz, quem diz isso com muita clareza é a constituição federal do Brasil de 1988, somos um povo tradicional do Brasil que faz parte da construção de nossa nação, estamos nos locais mais inóspitos, nas serras mais altas, nos rios mais perigosos, sempre em busca das jazidas de minerais garimpáveis, em muitos municípios como Itaituba por , somos a maior fonte de renda, além de levarmos esperança de riqueza a todo e qualquer brasileiro, seja ele doutor ou um analfabeto de qualquer cor e orientação sexual, por isso os constituintes originários criaram uma série de leis para garantir o direito dos garimpeiros.
Vou apresentar para vocês as principais diferenças entre a atividade garimpeira e a mineração definida pela lei brasileira:
Temos uma cultura de mais de 300 anos no Brasil, somos nômades, estando sempre em busca da jazida garimpeira, esteja ela onde estiver, passamos nossos conhecimentos de geração para geração, utilizamos os recursos naturais para nos desenvolver e utilizamos a inovação para melhorar nosso trabalho, aqui no Tapajós por exemplo quando se criou a reserva garimpeira a justificativa foi justamente abrigar os “garimpeiros Tradicionais” da região ou seja nós enquadramos perfeitamente o que diz o decreto 6040/2007 em seu artigo 3º, que vou ler para vocês:
“ I – Povos e Comunidades Tradicionais: grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição”.
A nossa tradicionalidade também é garantida no art. 215 da CF: “Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.
§ 1º O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.”
Acredito que lendo esses artigos todos entendam que o garimpeiro tem direito de ser reconhecido como povo tradicional brasileiro, mais se isso nunca acontecer materialmente, temos que buscar as Cortes Constitucionais, nossas garantias Constitucionais. Assim, são direitos mais que suficientes para que possamos lutar unidos pelo aguardado bem-estar social de todos nós.
Muitos me perguntam por que queremos ser reconhecidos como sociedade ou comunidade tradicional? Qual a vantagem em ser sociedade tradicional? Primeiro porque somos de fato uma sociedade tradicional, segundo porque precisamos desse reconhecimento para que possamos acessar plenamente os nossos direitos constitucionais que estão sendo negados há mais de 33 anos, nessa Reserva Garimpeira do Tapajós (GGT) terceiro para que o Estado Brasileiro, entes e autarquias de nossa República, em especial, o executivo, o legislativo, o judiciário e o Ministério Público, possa nós tratar como cidadãos brasileiros e não como criminosos.
A União e os demais Estados da República, precisam respeitar e cumprir a Carta Magna, nos seus artigos 21, 174 e 201 para que possamos trabalhar legalizados, onde os agentes públicos atuem nas áreas tradicionais garimpeiras com respeito à nossa cultura e não como eles acham que devemos realizar o nosso trabalho e ainda tenho muitos outros motivos para que o garimpeiro seja reconhecido como povo tradicional. Nós garimpeiros tradicionais temos as garantias constitucionais, mas somos tratados como bandidos.
Meus amigos isso não impedi que qualquer garimpeiro que não concorde em ser povo tradicional ou ser garimpeiro, possa migrar para a mineração, e essa é a diferença a mineração tem base econômica visando lucro para seus proprietários e são obrigadas a realizar condicionantes sociais (ou seja são obrigadas por lei), a atividade garimpeira é uma atividade de base social por sua natureza, cultura e definição. Temos um estatuto que é Lei e regra nossas relações de trabalho e econômicas.
O garimpeiro não tem patrão ele tem fornecedor e formam uma sociedade para que juntos retirarem do solo seu sustento e depois todos recebem sua parte de acordo com seu trabalho. Então se o garimpeiro queira passar a ser pequeno minerador ele pode a qualquer momento pedir a mudança de regime de PLG para Alvará de pesquisa, assim ele vai seguir a legislação para as mineradoras, ninguém vai impedir o garimpeiro de ser minerador. Mineradoras, ongs, mídia e alguns políticos que não conhecem o dia a dia do garimpo, nossa cultura e as leis que tratam da atividade garimpeira querendo impedir os garimpeiros de ser garimpeiros.
Aqui no Tapajós temos centenas de alvarás de pesquisa e até concessão de lavra dentro da Reserva Garimpeira do Tapajós e isso é ilegal já que a Reserva Garimpeira (é de uso exclusivo dos garimpeiros e garantido pelo art. 21, XXV da Constituição Federal de 1988, que determina o seguinte:
“estabelecer as áreas e as condições para o exercício da atividade de garimpagem, em forma associativa”.
Figura 1 – Reserva Garimpeira do Tapajós (RGT) e Unidades de Conservação Federais
Por esse motivo, a União Federal, não poderia por meio de simples decreto ou atos administrativos, acabar com a Reserva Garimpeira do Tapajós (RGT) e criar, sem estudos técnicos materiais e sem ampara formal e uma dezena de unidades de conservação, em especial a APA do Tapajós (Figura 1), se sobrepôs ás áreas tradicionais garimpeiras, torna o que era lega, a atividade garimpeira em situações de natureza criminal retrospectiva.
Assim o essas unidades de conservação que estão sobre a RGT ilegais, são ilegais pois um decreto não pode se sobrepor a uma Reserva de Natureza Socioeconômica, lastreada no direito constitucional e na tradicionalidade protegida por nossa Carta Magna, ou seja, a criação de todas essas ilegais Unidades de Conservação sobre a RGT só serem efetivas formalmente por Lei Federal Específica, como foi usado esse princípio pelo Ministério Público Federal (MPFD) para não permitir a revogação da Reserva Nacional do Cobre (RENCA), no final do Governo Michel Temer. Para alterar quaisquer “vírgula” ou “palavra” na Reserva garimpeira do Tapajós, teremos que regulamentar ou o Art. 21, XXV, da Constituição Federal, por emenda constitucional, fato que até hoje nunca aconteceu.
Hoje, nessa importante audiência pública, precisamos de três coisas iniciais: agradecer aos participantes que são amigos do Vale do Tapajós, conhecer e divulgar nossos direitos e dizer ao Brasil e a todos que a questão garimpeira não um problema ambiental isolado, não é ilegal por falta de direitos pois já estão garantido na cossa Constituição. Hoje, nosso maior problema é POLÍTICO.
Precisamos saber o que pedir para realmente resolver a questão garimpeira, não adianta buscar solução para 2% dos garimpeiros da Amazônia, precisamos resolver o problema e regularizar pelo menos a maioria das áreas tradicionais garimpeiras, construindo com diálogo e técnica aplicáveis a cada caso, soluções sustentadas com parceria com a União Federal e demais entes federativos, como falavam nossos avós: “quem não sabe rezar e pedir, muitas vezes xinga Deus”.
Agora vamos apresentar nossas propostas em âmbito estadual que deve ser o objetivo dessa audiência pública:
1. Criar junto a SEDEME uma diretoria de resolução de conflitos e apoio à atividade garimpeira tradicional, com o objetivo de negociar a liberação de anuências para cooperativas de garimpeiros em áreas já oneradas, mais que são de interesse das cooperativas e associações de garimpeiros nos estados. Precisamos combater o fato que a maioria das jazidas e depósitos de minerais garimpáveis ficarem eternamente nas mãos de empresas de mineração ou especuladores minerais, o que contraria os artigos 174 e 176 da Constituição federal, que destaca que a mineração tem que cumprir sua função social. A PLG, responde ao uso social dos pequenos depósitos minerais, bem como o interesse do setor mineral brasileiro. A ANM e os demais entes federados precisam equacionar a atividade garimpeira, bem-estar social e equilibro com o meio ambiente;
2. Fazer o inventário brasileiro de áreas de interesse para atividade garimpeira, para pleitear junto a União Federal a criação de novas RESERVAS GARIMPEIRAS nos estados, e no nosso caso, aqui no Província Garimpeira do Tapajós, apresentar junto a bancada paraense no Congresso Nacional, projeto de lei para regulamentar o artigo 21, XXV da Constituição Federal e atualizar a Leim7.805/89, a lei das PLGs;
3. Criar um canal de comunicação com o setor garimpeiro para que possa definir quais área devem ser prioridade na busca por anuências e criação de reservas garimpeiras no estado, ouvindo todos os capitais sociais locais e regionais que representam essa atividade econômica tradicional no Estado;
4. Criar o censo estadual da atividade garimpeira para realizar o censo socioeconômico de toda a atividade garimpeira no Brasil, avaliando toda a cadeia produtiva de setor produtivo especial, seus fornecedores e o tamanho das economias geradas pela atividade, em nosso Estado do Pará e nos demais entes federativos;
5. Buscar junto a Bancada Parlamentar do Pará no congresso nacional as principais pautas de interesse da classe garimpeira do estado, como a revisão do código mineral de 1969, a mudança da definição de minerais garimpáveis por depósitos e jazidas de minerais garimpáveis da lei 7805/89, unificação do regime de PLG e licenciamento autorizando as duas modalidades, regulamentar o artigo 201 § 7 que fala sobre a aposentadoria dos garimpeiros com os mesmo direitos do agricultor familiar mais que até hoje não atendeu a classe garimpeira, entre outras pautas importantes para o setor;
6. Criar um grupo de trabalho multisetorial com a participação de secretarias e órgãos ligados a atividade garimpeira tradicional, em todas as suas especificidades e características, incluindo representantes da classe garimpeira das diferentes regiões garimpeiras do estado, órgãos federias como a ANM, CPRM, ICMBio, entre outros e universidades federais, para a partir dos estudos gerados, estado e municípios possam criar o ordenamento territorial dessa atividade econômica, com bem-estar social e sustentabilidade, sempre levando em consideração a urgência e necessidades das sociedades tradicionais garimpeiras em trabalhar para sustentar suas famílias;
7. Revisar a normativa 006/2013 da SEMAS que define o licenciamento da atividade garimpeira no Estado do Pará, com a participação do capital social representativo dessa sociedade tradicional garimpeira no Pará, afim de criar a coerência entre a legislação ambiental, a legislação mineral e com a legislação fiscal em todas as esferas dos governos, inclusive já apresentamos sugestões de mudança no licenciamento ambiental a prefeitura de Itaituba em compatibilidade com a realidade local de cada região;
8. Criar um grupo de trabalho para realizar estudos antropológicos dessas sociedades tradicionais garimpeiras nos entes federativos visando definir as suas diferentes socias, geológicas e culturais e garantindo um melhor entendimento da gestão pública sobre a cultura garimpeira seus costumes, suas relações sociais, seu modo de vida e suas escalas e por fim reconhecer as sociedades tradicionais garimpeiras como povo tradicional do Brasil;
9. Reavaliar e readequar material e formalmente, as operações de fiscalização em nas áreas tradicionais garimpeiras no estado do Pará, fora de unidades de conservação de proteção integral, até uma readequação da legislação ambiental em seus diversos níveis federativos e sem que OS PLANOS DE GESTÃO dessas unidades de conservação de uso sustentável estejam finalizados e aprovados;
10. Quando houver uma necessidade urgente de fiscalização em áreas tradicionais garimpeiras, que sejam priorizadas a aplicação de notificação e sem destruição de equipamentos nas áreas onde for constatada irregularidades, conforme regrado no Artigo 5º , LIV, in verbis;
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
11. Criar, normas definindo Termo de Referência para um licenciamento específico para a atividade garimpeira com licença única e coerente, para que os garimpeiros tradicionais possam promover a preservação do meio ambiente e sua recuperação com atividades produtivas sustentáveis como a plantação de florestas produtivas, com açaí, cacau e espécies madeireiras nativas, garantindo o melhor aproveitamento das áreas e sua recuperação com desenvolvimento local;
12. Promover a descentralização de toda o licenciamento da atividade garimpeira para as secretarias de meio ambiente dos municípios e garantir que elas tenham condições de licenciar os garimpos inclusive com a supressão vegetal em APP’s como a que ocorre para as grandes mineradoras;
13. Criar o consócio dos municípios garimpeiros do Pará e em outros estados, com o objetivo de unir forças para que a atividade tradicional garimpeira cumpra seu papel social, econômico e ambiental, apoiar os municípios na criação de uma estrutura robusta para fomentar a legalização da atividade garimpeira em municípios com potencial reconhecido para a atividade e criando uma cadeia de valor verticalizando a economia garimpeira dentro do estado;
14. Criar um acordo de cooperação técnica entre o estado e as prefeituras paraenses, para analisar e se possível desembargar as áreas autuados nas operações de fiscalização do já incluindo os mesmos no programa de regularização da atividade garimpeira estadual;
15. Garantir a participação das sociedades tradicionais garimpeiras em nas decisões importantes referentes políticas e programas do Estado e criar políticas públicas para organizar as entidades representantes do capital social local e regional além de priorizar o cadastro individual e coletivo dos garimpeiros do estado do Pará inclusive com a inclusão de municípios garimpeiros e todo cidadão paraense que demandem interesse em legalizar suas atividades de garimpagem tradicional;
16. Definir o modo de trabalho e os critérios para melhorar segurança e dignidade de todos que exercem o trabalho de garimpagem, definido EPIs que possam ser utilizados nas frentes de lavras, bem como criar uma cartilha informativa para educação ambiental dentro da atividade garimpeira;
17. Construir centros de apoio social e de saúde nas áreas tradicionais de garimpos para atender as comunidades garimpeiros;
18. Buscar junto às mineradoras do Estado um programa de cotas para garimpeiros que queiram deixar essa atividade tradicional, mas desejam continuar trabalhando no setor mineral;
19. Criar o programa de educação ambiental estadual para a atividade garimpeira;
Itaituba – Pará ,14 de abril de 2023
MARCELO NORKEY DUARETE PEREIRA e LETICIA ESTRELA”
Os Garimpeiros não querem privilégios e muito menos redução de impostos ou bolsas humanitárias, apenas desejam ser brasileiros e poder trabalhar sob o manto de nossa Constituição Federal.
Num futuro muito próximo seremos apenas florestas e grandes cidades. As Sociedades Caboclas Amazônicas ainda viverão sob o manto da ignorância da humanidade por algumas dezenas de anos. O Brasil de hoje já é um adjetivo de nossa grande floresta – a Amazônia. Precisamos destituir da “Grande Mídia Nacional e Global, que nossas sociedades residentes e imemoriais não são mais uma turba social invasora. Somos, somos parte dessa imensa “Hileia de Humbold” desse grande planeta ambiental e cultural, chamado Amazônia.
Msc. Antonio Feijão