As mulheres e homens do Agro, até então reconhecidos como heróis da nação, como salvadores do PIB, responsáveis pela segurança alimentar do Brasil, de 1/4 da população mundial e hoje os grandes pilares de apoio à sobrevivência de todos nós durante a pandemia, um belo dia acordaram com a pecha de caloteiros, maus pagadores e com uma dívida biliardária, perseguidos até a exaustão, pela Receita Federal para pagarem um passivo que até então inexistia, por apenas terem obedecido decisões do STF.
Na minha opinião o STF é o único responsável pela existência do passivo biliardário por ter declarado que o Agro não precisava mais recolher o Funrural, em duas decisões unanimes de plenário, como comprova uma mera consulta ao site daquela Instituição.
Em março de 2017, depois de um longo trabalho junto aos Ministros daquela casa, Alexandre Moraes, como relator, conseguiu uma vitória pífia de 6 a 5 na votação do plenário, pela Constitucionalidade. Publicado o Acórdão, ou melhor, republicado em razão da primeira publicação ter sido feita com erros, todos os embargos, interpostos por várias entidades do Agro à decisão, foram rejeitados “de plano” e rapidamente.
A Lei que havia sido morta pelo STF nos idos de 2010 e 2011 por ser inconstitucional, deixando de existir no mundo Jurídico desde a sua criação, o que não se concretizou na época pelo fato de o próprio STF ter demorado a informar ao Senado, como manda a nossa tão sofrida Constituição e pela Casa Legislativa, por sua vez, ter retardado a aprovação que ao final foi por unanimidade na CCJ, através da Resolução 13 do Senado Federal. Foi depois transformada em Resolução 15 do Congresso Nacional, também, por votação unanime. Desde então desrespeitada.
A Casa Civil, em razão de um Decreto do Governo Fernando Henrique que obrigava a obediência de todos os servidores públicos federais às Resoluções do Congresso, retirou do ordenamento Jurídico os artigos da Lei originária declarados, por duas vezes inconstitucionais por unanimidade da plenária do STF e confirmadas pelo Congresso Nacional. Mais uma vez, a pedido dos autores, o Ministro Moraes, em decisão monocrática sem ouvir a parte contrária, determinou a Casa Civil que inserisse de volta no ordenamento Jurídico os dispositivos anteriormente retirados.
Mas, a história do passivo biliardário do Funrural não termina aí, está dividida em capítulos como uma novela trágica para o mundo Rural. Ainda nos idos de 2018, um grupo de lideranças do Agro reuniu-se com o Presidente Temer. Ocasião em que estavam presentes os Ministros Meireles e Blairo Maggi, que justiça seja feita, fez um discurso acalorado contra a existência do Passivo do Funrural declarando ser o mesmo impagável.
Durante a audiência o Senador Dário Berg, do MDB de Santa Catarina que havia viabilizado o encontro, Jeferson Rocha, Sérgio Pitt, Marcos Melo, Nabhan Garcia, eu e outros nos pronunciamos contra a cobrança do Passivo. Quando afirmei que não estava ali para falar com o Presidente da República que era um cargo passageiro e sim com o colega e Mestre em Direito Constitucional, por ser a sua condição de antes e após a Presidência, Temer se dirigiu a mim, olhando nos meus olhos e nitidamente emocionado, afirmou que resolveria o problema do passivo antes de sua saída do governo e ninguém seria prejudicado. Confesso que foi uma das mais belas inverdades que já me foi dita cara a cara, proferida por um Presidente da República diante de tantas testemunhas.
A luta não parou aí, o hoje Presidente declarou em vídeos, durante a campanha, que resolveria o problema do Funrural, porém, lastimavelmente o atual governo continua manietado pelas mesmas assessorias técnicas, herdadas de governos anteriores, que com seus pareceres idênticos aos do passado, continuam impedindo o cumprimento da promessa de campanha do Presidente, todavia, acreditamos que honrará sua promessa com o setor que o apoiou desde o primeiro dia. O Presidente, que tem afirmado apoiar o Agro, pode resolver facilmente o assunto: basta usar a Resolução 15 do Congresso Nacional que está vigente e simplesmente tornou inexistente qualquer débito do Funrural, fazendo-a ser respeitada por todos os servidores federais.
Durante o desenrolar da novela do Funrural o Congresso aprovou a Lei 13.606, denominada “Refis do Funrural”, que não teve a adesão da grande maioria dos pretensos devedores, pelo fato de não reconhecerem a dívida criada pelo passivo retroativo gerado com a terceira decisão do STF.
Para completar mais um capítulo da novela, vale narrar a reunião das entidades do Agro, parlamentares da FPA e o Representante da Ministra da Agricultura com o Ministro Paulo Guedes, graças a intermediação da Deputada Federal Aline Sleutjes, onde o Ministro prometeu resolver o problema do passivo do Funrural no bojo da proposta da Reforma Tributária do Governo. Não estou afirmando por ouvir dizer, eu estava presente e ouvi a afirmativa! Continuamos aguardando que todas as promessas sejam cumpridas e haja a solução do passivo do Funrural, com a sua extinção. Como ficaria a nossa República se a Nação não pudesse acreditar nas promessas feitas por altas autoridades do Executivo?
Foram necessárias três sessões plenárias do STF para conseguir a declaração de constitucionalidade do Funrural, uma vitória pessoal do Ministro Alexandre Moraes. Decisão que não teve a cautela de excluir do pretenso débito o período em que o STF, reiteradamente, afirmou a inconstitucionalidade da cobrança e o consequente não pagamento do tributo, inclusive, publicando em seu site que o produtor estava desobrigado a recolhe-lo.
Vejam bem a seriedade do que foi narrado até aqui e o risco de insegurança Jurídica que a Nação corre. Duas decisões unanimes do Plenário do STF foram derrubadas e o passado alterado, por uma decisão de 6 a 5. Qual a segurança Jurídica de qualquer setor ou cidadão diante deste fato? Nunca imaginamos que o passado e as decisões do STF pudessem ser mudados tão facilmente.
Gil Reis
Consultor em Agronegócio