A manhã despertara num dia ensolarado de abril, as nuvens passavam lentas em movimentos sincronizados. O vento chegou dissipando o calor e as flores, desabrochadas, exalavam um aroma que parecia ter saído do paraíso. Enquanto isso, ele esperava, aflito, no saguão do hospital, esperava o chegar do médico que tinha marcado para às 7:00 h a sua chegada. Aflito, pois ele decidira acompanhar todo o processo para ver o nascimento daquele ser esperado por nove meses no ventre de sua mãe. Aproxima-se a grande hora juntamente com o medo de não conseguir ficar lá até o final.
Ele dizia para ele mesmo:
- Não sei se vou conseguir, talvez me falte pernas para não dizer coragem. Naquele momento, chega o médico e o convida para subir e trocar de roupa, pois, já está no horário.
Lógico, que para o grande Doutor era um dia como um outro qualquer, como ele mesmo dissera, aquele seria o seu parto de número 3,888 e só mais algumas poucas horas para ele completar o seu número expressivo de partos feitos, mas para aquele pai que ali se encontrara a cada instante nervoso, a aflição tomava-lhe de conta, pois além do medo da sala de cirurgia, havia a ansiedade pelo nascimento de seu rebento.
Ele, sentado no canto da sala de cirurgia, tinha nas mãos uma máquina digital de última geração, preparada para ativar vários clicks após o comando da enfermeira. Atento, mas nervoso, ouviu uma voz que dizia: - Acho melhor ele sair, pois ele está pálido e pode desmaiar e eu já estou cansada de socorrer pais caídos neste chão.
Então, ele mesmo diz: – Não sinto minhas pernas, acho melhor eu sair mesmo. – Alguém poderia registrar o nascimento do meu filho? – Perguntou o pai “corajoso” pai, que logo saiu e foi ver a natureza. Que coisa engraçada! Ele não estava olhando a cirurgia, mas o seu subconsciente lhe comandava naquele instante. Porém para a sua alegria uma das enfermeiras se prontificou em registrar aquele momento tão especial. Talvez ela tenha ficado com dó do “corajoso” pai.
E ele olhando o passar do tempo, esperava pelo momento tão aguardado, esperava para soltar do coração toda a sua felicidade. Então, de repente, ele veio como um pássaro, com olhos fechados, seus braços esticados para cima como assas querendo ruflar sem saber para onde, sincronizado com um choro como que dissesse: Cheguei. Ele nasceu pequenino e repleto de inocência e juventude. Seu pai radiante de alegria o pegou em meus braços, sentindo toda a sua pureza e a felicidade de tê-lo ali, bem pertinho dele. O rei estava bobo, ou será que era o Bobo que ali se tornara rei? Não conheço na história nenhum reinado em que o Bobo se tornou rei, mas sim o rei que se tornou bobo.
Ele olhava para a sua recém-nascida cria e agradecia a Deus pelo privilégio de ser pai e ser responsável por ajudá-lo em seu crescimento, pois como qualquer um bom pai, naquele momento muitas coisas se passavam em sua cabeça, muitas imagens e momentos se faziam presentes naquele instante.
Aquelas coisas tipo: Brincando na praça, o primeiro ano, os primeiros passos, indo ao estádio juntos e torcendo pelo mesmo clube etc. Tudo perfeito, como disse certa vez um grande músico: – Sonhos vem, sonhos vão, o resto é imperfeito.
Ele era um pássaro lindo com cheiro do paraíso, trazendo com ele todas as virtudes divinas e uma vontade de voar incrível. Os dias, os meses e anos iam passando e a cada passar do tempo, ele ia crescendo em virtudes, sabedoria e sonhos, sonhos audazes, grandiosos para um pássaro que ainda vivia em seu ninho familiar. Suas penas ficavam mais visíveis, fortes e bonitas e ele os mostrando que logo, logo voaria para fora do ninho, pois esse era o seu sonho e propósito.
O tempo foi passando e esse lindo pássaro foi se tornando um homem, um amigo, o único amigo, na forma literal da palavra, de seu pai. Aquele amigo em quem se pode confiar, um amigo amável, paciente, tolerante, compreensível e acima de tudo, amigo. Alguém com quem se pode contar a qualquer hora do dia. Seu pai passou a admirá-lo e tornou-se o seu Fan, pois qualquer momento ao seu lado, era um momento de prazer e aprendizados. Seu sorriso aliviava qualquer incômodo de dor, assim como o seu abraço e ele, seu pai, tinha o privilégio de tê-lo ali, bem perto dele, todos os dias, bem em sua frente.
Nós conversávamos e eu o ensinava tudo sobre a vida enquanto ele falava sobre os seus sonhos e a vontade de aprender tudo o que eu tinha para ensiná-lo. Eram momentos gostosos, prazerosos e inesquecíveis, especialmente quando saia de sua boca: Obrigado pai, eu te amo. Então, ele ia para o seu quarto com a sensação de dever cumprido.
Aquele lindo pássaro, agora, era adulto e pronto para voar, era um barco que ficou no cais se preparando para navegar pelos mares da vida. Medo e insegurança pairavam sobre aquele pai, pois apesar de tudo que ensinara para ele, ele ainda era, aos seus olhos, aquele pequeno passarinho indefeso, inocente e cheio de sonhos. Então ele completou 18 anos, já era um pássaro adulto, bonito e cheio de vigor e que já sabia que iria voar pelos ares da vida, iria voar para bem longe do ninho e deixar com os seus somente a saudade e o desejo que Deus iluminasse e o protegesse em seu caminho, pois tudo o que ele levará de valoroso em sua bagagem era o que para ele foi ensinado ao longo de sua juventude. Foram meses acompanhando o seu tão esperado voo, o seu progresso pessoal e a cada dia ele nos mostrando que estava colocando em prática aquilo que de nós aprendera.
Agora ele era adulto, estava voando com as suas próprias asas, resolvendo sozinho seus próprios problemas e ainda sendo, de seu pai, o melhor amigo. As suas asas ruflaram cheias de juventude, força e verdades em um voo longínquo para longe dos seus, levando em sua bagagem todos os ensinamentos que seus pais lhe deram, em especial o de ser um verdadeiro amigo.
O que mais podes querer?
Há em ti um vasto mundo
e o que há de mais profundo,
vem de teu íntimo ser.
És parte do todo amor,
que nada na vida apague o teu brilho
Ei, para Deus, um dia voltar, sem deixar
de te amar, meu AMADO FILHO.
(Jorge A. M. Maia)