Olá, meus amigos! Espero que estejam todos bem. Hoje, na nossa coluna Emdireito, vamos discutir uma decisão judicial que merece a atenção de todos nós, consumidores conectados e cada vez mais dependentes dos smartphones para trabalhar, estudar, acessar bancos e até cuidar da saúde: a proibição judicial de bloqueio de celulares por inadimplência de empréstimos.
A prática, adotada por algumas financeiras que operam empréstimos com garantia via aplicativo, foi recentemente considerada abusiva e inconstitucional, e as empresas estão sendo obrigadas a desativar os apps de bloqueio em até 15 dias, sob pena de multa diária. Vamos entender o que está em jogo.
O caso: empresas que “travam” o celular como punição por dívida
Em alguns contratos de crédito pessoal, especialmente voltados a públicos mais vulneráveis, como trabalhadores autônomos ou consumidores negativados, a garantia do empréstimo não é um bem físico ou uma fiança, mas o próprio telefone celular.
A prática funciona assim: o consumidor toma o crédito e, se não paga em dia, o aparelho é bloqueado remotamente. O cliente perde o acesso a funções básicas, como aplicativos bancários, redes sociais, WhatsApp e até a câmera, como forma de “incentivo” ao pagamento. Há relatos de celulares totalmente inutilizados, mesmo que o contrato ainda estivesse em renegociação.
O que diz o Direito do Consumidor?
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) é claro: práticas que imponham desvantagem exagerada, comprometam a dignidade do consumidor ou contrariem a boa-fé são consideradas abusivas (art. 39, V). A utilização de um bem essencial, como o celular, como instrumento de coação indireta para pagamento de dívida representa exatamente isso: constrangimento, abuso de poder econômico e violação do equilíbrio contratual.
Além disso, o artigo 42 do CDC estabelece que o consumidor inadimplente não pode ser exposto ao ridículo, nem ser submetido a qualquer tipo de ameaça ou interferência na sua rotina pessoal como forma de cobrança coercitiva.
E o que diz a Constituição Federal?
A prática também contraria preceitos constitucionais fundamentais:
- Art. 5º, incisos X e XII: garantem o direito à intimidade e à inviolabilidade das comunicações pessoais. O bloqueio de celular interfere diretamente na privacidade, liberdade de comunicação e dignidade do usuário.
- Art. 1º, inciso III: estabelece a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República. Reduzir o acesso de alguém a serviços digitais essenciais por causa de uma dívida é uma afronta direta a esse princípio.
- Função social do contrato (art. 421 do Código Civil): o contrato deve servir a finalidades éticas, justas e proporcionais. Contratos que impõem sanções desproporcionais ao consumidor, sobretudo no contexto da desigualdade de informação e poder, devem ser revisados ou anulados judicialmente.
Decisão judicial e consequências práticas
A Justiça, ao analisar ações contra financeiras que utilizam esse tipo de bloqueio, determinou:
- A retirada imediata dos aplicativos usados para bloquear os telefones;
- A proibição de novos bloqueios, sob pena de multa de até R$ 100 mil por dia;
- O reconhecimento de que a prática afeta diretamente a dignidade e a liberdade do consumidor, inclusive em sua esfera digital, hoje considerada uma extensão da cidadania.
Essa decisão é um marco na proteção da liberdade digital do consumidor e reforça o entendimento de que inadimplência não pode ser combatida com medidas autoritárias ou tecnológicas invasivas.
E se eu for vítima desse tipo de bloqueio?
Se o seu celular for bloqueado por uma financeira ou aplicativo:
- Registre prova do bloqueio: prints de tela, e-mails, mensagens;
- Faça uma reclamação nos canais da empresa e salve os protocolos;
- Registre queixa no Procon ou no site consumidor.gov.br;
- Procure a Defensoria Pública ou um advogado para ajuizar ação de danos morais e materiais, se for o caso.
Em tempos de hiperconectividade, bloquear o celular é mais do que travar um objeto: é limitar o exercício da cidadania digital. É impedir que a pessoa acesse sua conta, fale com sua família, solicite uma consulta médica ou até mesmo consiga emprego.
A inadimplência existe, sim — e precisa ser tratada com soluções justas, como renegociação, educação financeira e transparência. Mas o direito ao crédito não pode virar pretexto para autoritarismo disfarçado de contrato.
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Até domingo que vem!