O Brasil parece condenado a rir da própria desgraça como um bêbado trôpego. Agora, em mais uma ópera bufa tropical, setores da extrema-direita querem conceder anistia aos golpistas do 8 de janeiro — como se fosse uma promoção de Black Friday: destrua a democracia e, em seguida, receba perdão grátis. É o cúmulo da cretinice institucional. O Globo já cravou com precisão em circunspecto artigo: “anistia é uma afronta irresponsável à Constituição”. Não é só afronta, é deboche, é ironia perversa, é cuspir no rosto da República. Como dizia Celso de Mello, “o silêncio diante da ruptura constitucional é cumplicidade”. Pois bem: perdoar golpistas seria o mesmo que bater palmas para incendiários que atearam fogo na casa comum e ainda pedem aplausos pelo espetáculo mostrando a genitália.
A desculpa esfarrapada é sempre a mesma: “pacificar o país”. Mas como pacificar com quem prega guerra? Como pacificar com quem, numa covardia à nação, gaba-se de ter articulado a intromissão de outro país para arruinar a economia? Hannah Arendt já avisava que perdoar sem arrependimento é perversão. Aqui não há remorso, há soberba. Bolsonaro e seu séquito continuam delirando com narrativas conspiratórias, como alcoólatras de poder que jamais admitem estar bêbados. Dar anistia a essa turma é como entregar fósforo a incendiário em plena seca amazônica. Já vimos esse filme em 1979: a Lei da Anistia blindou torturadores e transformou verdugos em aposentados de luxo. Resultado? Um país que até hoje engole em seco a impunidade como se fosse feijão azedo e vê seus filhotes fazendo caretinhas de deboche à nação.
A democracia não é um buffet onde se escolhe o prato da conveniência. Ela exige regras. Norberto Bobbio dizia: “democracia é o governo das regras”. Se não há punição para quem tenta derrubar o Estado de Direito, o recado é claro: pode tentar de novo, a casa é sua. É exatamente esse o veneno da anistia. Em vez de frear os loucos de farda, de toga ou de paletó, ela os estimula a sacar a arma da insurreição. O Brasil, que se gaba de ser anfitrião da COP30, quer mesmo aparecer diante do mundo como um país que acaricia seus próprios traidores? Quer posar de vanguarda ecológica ao mesmo tempo em que pratica a ecologia do crime político, reciclado de tempos em tempos?
É hora de falar sem eufemismos: anistiar golpistas é uma manobra diabólica, um pacto com o demônio da História. É a institucionalização da reincidência. Rui Barbosa já alertava: “a pior ditadura é a do Poder Judiciário quando corrompido”. Podemos acrescentar: pior ainda é o Legislativo transformado em lavanderia de crimes contra a pátria e em palco anárquico do estímulo à destruição da paz nacional. A democracia não morre com tanques, morre com covardias sucessivas, com perdões travestidos de virtude. Se essa anistia passar, o Brasil não estará reconciliado: estará condenado a ser a eterna república da piada pronta, onde o crime político paga dividendos e o golpista brinda com champanhe. Ora faça o favor!
Anistia aos golpistas: a manobra diabólica
