A Justiça Federal condenou o ex-secretário de Saúde do Amapá, Gastão Valente Calandrini de Azevedo, por participação em um esquema de fraude em licitação e superfaturamento que desviou mais de 28 milhões de reais da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa).
A sentença, proferida pelo juiz federal Athos Attie, expõe detalhadamente práticas ilícitas que beneficiaram diretamente empresas responsáveis pela alimentação hospitalar entre 2017 e 2018. Entre elas, a Primo José Alimentação Coletiva aparece como uma das principais peças do esquema, com participação central nas irregularidades identificadas.
Segundo as investigações conduzidas pela Controladoria-Geral da União e pelo Ministério Público Federal, no âmbito da Operação Banquete, houve manipulação de pesquisas de preços, montagem de falsas concorrências e execução de contratos com valores muito acima dos preços de mercado.
O processo licitatório, de acordo com a decisão, já nasceu viciado e foi mantido de forma proposital pelo ex-secretário, mesmo após alertas formais da Procuradoria-Geral do Estado e da Controladoria-Geral do Estado, que recomendaram a anulação do pregão devido às irregularidades encontradas.
Em vez de seguir as recomendações técnicas, Calandrini recorreu informalmente a um conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, que sequer tinha competência para avaliar o processo, e utilizou trechos isolados desse parecer superficial para justificar a continuidade do certame. O juiz Athos Attie classificou a conduta como deliberada, afirmando que houve uma intenção clara de favorecer contratos já direcionados.
A atuação da Primo José Alimentação Coletiva na fraude foi amplamente detalhada na sentença. De acordo com a Justiça, a empresa, administrada por Joelson Pimentel dos Santos, atuou diretamente na apresentação de cotações combinadas para manipular o preço de referência.
A Primo José e a Nutri & Service Alimentos EIRELI dividiram previamente os lotes da licitação e apresentaram propostas com erros idênticos, o que, para o magistrado, evidencia que não houve competição real entre as empresas. Essa ação conjunta permitiu a construção de uma falsa impressão de concorrência, garantindo o controle artificial dos valores e possibilitando o superfaturamento dos contratos firmados com o Estado.
A decisão aponta que a participação da Primo José Alimentação Coletiva foi determinante para elevar o valor final dos contratos pagos pela Secretaria de Saúde, contribuindo diretamente para o prejuízo superior a 28 milhões de reais. A presença da empresa em fases-chave do processo reforçou o entendimento de que se tratava de um esquema coordenado, envolvendo agentes públicos e privados.
Além de Calandrini, diversos envolvidos foram condenados:
- Joelson Pimentel dos Santos, proprietário da Primo José Alimentação Coletiva, foi condenado ao ressarcimento solidário limitado a 15,6 milhões de reais, ao pagamento de multa civil de 300 mil reais, à suspensão dos direitos políticos por quatro anos e à proibição de contratar com o poder público por oito anos.
- Adriano José Silva Nogueira Lima, gestor da Nutri & Service, também foi condenado a ressarcir solidariamente o dano, com limite de 13,2 milhões de reais, e ao pagamento de multa e suspensão de direitos.
- Marcelo Dias, pregoeiro do certame, recebeu condenação que inclui ressarcimento limitado a 1 milhão de reais, multa civil e suspensão de direitos políticos por quatro anos.
- Raimundo Simeão de Souza, responsável por apresentar cotação fictícia, foi condenado nos mesmos termos de Marcelo Dias.
- Priscylla Gemaque Matos e Léa do Socorro Franco Silva também foram responsabilizadas solidariamente e sofreram penalidades semelhantes.
As empresas envolvidas, em especial a Primo José Alimentação Coletiva, citada diversas vezes na sentença, foram responsabilizadas com base na Lei Anticorrupção, que prevê sanções administrativas e financeiras, além da impossibilidade de contratar com o poder público por um período determinado.
A decisão do juiz Athos Attie conclui que o processo licitatório foi comprometido desde sua origem até a fase de execução contratual. Segundo ele, não houve meras falhas administrativas, mas sim um esquema estruturado para desviar recursos públicos destinados à alimentação de unidades hospitalares do Estado.
O caso é considerado um dos mais graves episódios de superfaturamento julgados no setor da saúde no Amapá.

