Choro, desespero e principalmente desânimo. Esse é o retrato dos moradores do Manguiers, em Remire-Montjoly, Guiana Francesa. Eles tiveram suas casas demolidas na manhã de segunda-feira, 09. Foram várias semanas de incerteza até iniciar a demolição para o desmonte da favela. A maioria dos moradores são brasileiros do Amapá e do Maranhão.
A ação mobilizou mais de 100 policiais para supervisionar uma área que se estende por 800 metros e abrigava cerca de 400 famílias. A demolição foi iniciada por volta das 7 horas da manhã, sob uma forte chuva.
O acesso dos jornalistas foi proibido, mas os moradores enviaram vídeos para os meios de comunicação onde era possível ver os caminhões que evacuavam propriedades dos habitantes. Após 11 horas, a imprensa, sob forte escolta, finalmente teve acesso ao local.
“Dizer que as evacuações seriam proibidas durante a estação chuvosa não é necessariamente razoável. Foi feita uma tentativa de garantir que esse inconveniente climático seja o mínimo para todos. […] O conjunto dos pedidos apresentados pelos moradores locais e as associações foram rejeitados no sábado pelo tribunal”, lembrou o sub-prefeito Daniel Fermon.
Residências legais
Para ajudar os habitantes a encontrar uma solução para a realocação, um centro social foi instalado em frente à base naval de Dégrad-des-Cannes. “Nesta manhã, apenas 27 famílias se apresentaram no nível do centro social e são apenas quarenta pessoas”, diz Daniel Fermon.
As operações terminaram nesta terça-feira,10. Em Manguier permaneceu apenas onze casas declaradas “legais”, de acordo com o município. O acesso à Route des Plages continua bloqueado.
Segundo Vaneza Ferreira, administradora do perfil Brasileiros na Guiana – grupo de uma rede social que tem grande repercussão-, as 400 famílias expulsas moram na invasão há 30 anos. Ela conta que os moradores já haviam sido avisados, “estava previsto para serem expulsos dia 25 de novembro mais foi adiado, na segunda-feira iniciou a derrubada das casas dos moradores, eles tentaram recorrer com apoio da associação les médecins du monde dia 7 de dezembro, mais a justiça não aceitou”, declarou.
No relatório social divulgado pela prefeitura na noite de segunda-feira consta que “100 pessoas se apresentaram no centro social (Samu Social e CCas), cinquenta estariam acomodadas em hotel”, provavelmente, explica Vaneza, famílias com crianças estão na rua, “sem contar todos aqueles em situação irregular que não estavam presentes. É realmente intolerável”.
A reclamação dos brasileiros despejados é que a maioria mora há muitos anos na Guiana Francesa e tem filhos nascidos em território francês. Maria Pantoja Nascimento é uma dessas brasileiras. Moradora do Manguiers desde 1968, construiu a família e um pequeno restaurante que foi demolido.
“Pago o imposto predial, o imposto habitacional, o Sacem, a eletricidade, a água. Quando fomos ver o prefeito, ele nos mandou ficar! E de repente, eles nos dizem que temos que sair e que eles vão quebrar tudo”
Maria explica que a compra da terra nunca lhe foi proposta. “Poderíamos trabalhar com a minha família, eu tinha os meios para comprar se fosse necessário, é difícil! Encontrei uma casa a 800 euros em Cogneau-Lamirande, mas sem água ou eletricidade! Não tenho marido, não tenho recursos e tenho uma filha com deficiência. Sem o restaurante, como vou pagar as contas?”. Maria é apenas uma dos vários brasileiros que foram desalojados na Guiana Francesa.
Sobre a desocupação da área
A desocupação com a derrubada das casas na favela de Manguiers faz parte da nova política de imigração imposta pelo atual presidente francês, Emmanuel Macron. Na Guiana Francesa, o motivo usado como desculpa para a destruição das favelas seria para impedir a grande quantidade de imigrantes ilegais e para deter a criminalidade crescente na região.
Em setembro outra favela foi demolida, a Matinha, também uma comunidade de imigrantes. No local, que existia há mais de 30 anos, moravam cerca de 700 famílias, a maioria brasileiros e haitianos. Alguns desabrigados do bairro conseguiram alojamento, mas a maioria ainda luta junto aos órgãos sociais por uma moradia.