Um documentário sobre o projeto foi apresentado aos senadores e convidados. Nele é mostrado o trabalho conduzido em círculos de discussão e de engajamento da comunidade. Com essa ferramenta de conversa, as pessoas ouvem as histórias e as perspectivas umas das outras. A comunidade também recebe cursos, abraços e, principalmente, conversa. Os resultados são o resgate de dezenas de meninas que praticavam automutilação, criminalidade em queda e uma escola que registra Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) em ascensão.
Em seu relato, a juíza Carline Negreiros lembrou que ao chegar à comunidade, num primeiro momento ouviu perguntas sobre o porquê de juízas, promotoras e outros servidores do sistema de justiça, com uma vida profissional e material bem resolvidas, estavam ali em um dos bairros mais violentos de Santana. “Nosso endereço é o Planeta Terra e tudo o que atinge o outro, nos atinge também. Foi com este pensamento que decidimos intervir naquela comunidade, para onde vamos sem acompanhamento de policiais porque os moradores nos recebem, nos aceitam e nos vêem como parte”.
A construção desta relação de confiança com a comunidade assistida pelo projeto também foi relatada pela juíza aos senadores. “Não foi fácil, porque havia muita desconfiança. Mas, conseguimos mostrar que queríamos levar a justiça social, uma vez que a justiça punitiva não está resolvendo o drama da violência. A população carcerária superlota os presídios porque estamos resolvendo processos e não os conflitos, e a Justiça Restaurativa busca resolver os conflitos porque o objetivo fim do Judiciário é a pacificação social”, explicou.
Após o relato da magistrada, o senador Lucas Barreto informou à Comissão que, como resultado do trabalho de Justiça Restaurativa, houve uma redução de mais de 200 processos só na 1ª Vara Cível e de Fazenda Pública de Santana, entre 2017 e 2018, e exemplificou a redução em todas as outras varas e juizados da Comarca.
A audiência sobre Justiça Restaurativa promovida pela Comissão de Direitos Humanos do Senado contou com a presença do pioneiro desta abordagem, o australiano Terry O’Connell. Ele e outros especialistas estrangeiros da área do direito estavam em Brasília para o Congresso Internacional de Justiça Restaurativa, que ocorreu pela primeira vez no Brasil, na quinta-feira (23).
A tese defendida por O’Connell e que está crescendo no sistema de justiça brasileiro é singela e ao mesmo tempo transformadora: Justiça precisa trabalhar de forma que as pessoas se coloquem no lugar daquelas que elas prejudicaram, para que saibam o efeito negativo que provocam na vida de alguém.
No Brasil, a Justiça restaurativa foi implementada há cerca de 20 anos, mas só em 2016, após recomendações da Organização das Nações Unidas (ONU) para os países-membros, o Conselho Nacional de Justiça publicou a Resolução nº 225 com a Política Nacional de Justiça Restaurativa no Poder Judiciário, contendo diretrizes para a implementação e difusão das práticas dessa modalidade de mediação. (Por Comunicação Tjap)