Ao longo da primavera e do verão, eles cumpriram jornadas de sessenta horas semanais, e em agosto foi anunciado que passariam a trabalhar nas tardes de domingo também. Esse trabalho seria estritamente voluntário, mas todo animal que se ausentasse teria sua ração reduzida à metade.
Mesmo assim, foi necessário deixar certas tarefas por fazer. A safra foi um pouco menos bem-sucedida do que no ano anterior, e dois campos que deveriam ter sido semeados com raízes não o foram, porque o terreno não havia sido arado com antecedência suficiente. Era possível prever que o inverno seguinte seria muito duro.”
Esse trecho conta “A Revolução dos Bichos” de George Orwell que revela narrativas comuns dos regimes totalitários, por meio de uma breve, mas intrigante sátira.
Nela, os animais de uma fazenda se rebelam contra a opressão humana e têm como líderes os porcos. O problema é que a promessa de igualdade se desfaz, à medida que os porcos assumem características autoritárias, típicas da corrupção pelo poder.
Temas como manipulação e corrupção expõem a fragilidade utópica dos regimes afins, flertando com os perigos do poder absoluto.
De mais a mais, convoca o leitor a perceber o quão forte é a manipulação da linguagem como instrumento de controle, simbolizado pela mudança nos mandamentos da fazenda.
Além disso, recobra a consciência contra a apatia e a passividade das massas oprimidas, representada pelos outros animais que não questionam a liderança dos porcos.
Orwell ensina e não doutrina. Divertidamente, usa de sua narrativa para alertar da importância da vigilância constante contra a tirania.
Traz destaques de como ideais revolucionários podem ser distorcidos quando o poder está concentrado em poucas mãos.
A brincadeira de Orwell fica ainda mais séria, quando, na obra, ressalta a fugaz memória histórica e a insistente manipulação da narrativa pelos donos do poder e a forma como a fazenda passa por diversas mudanças e os acontecimentos são reinterpretados, para atender aos interesses dos porcos no comando.
Os bichos de Orwell, que representam diferentes classes e ideologias, ilustram a complexidade das relações de poder e, nelas, a traição e a colaboração evidenciam as contradições próprias dos movimentos revolucionários, por serem incompatíveis.
Ao final da trama, fica nítido que os sete mandamentos iniciais da fazenda, estabelecidos para garantir a igualdade entre os animais, são gradualmente modificados pelos porcos para justificar seus próprios privilégios, ilustrando a corrupção do ideal inicial da revolução.
Tipicamente comum, habitual e vivenciado por boa parte do mundo dos animais!
A exploração da tecnologia, como a manipulação da fazenda, espelha a forma como regimes autoritários frequentemente controlam informações e a comunicação para consolidar seu poder.
E, sim, Orwell faz lembrar que os movimentos de libertação podem ser desvirtuados por líderes autoritários, através da importância da vigilância constante (nos meios de comunicação) e da participação ativa na preservação da liberdade, pela linguagem, pela disseminação de “pensamentos críticos” e pela compreensão rasa dos eventos históricos.
E que bom que Orwell sabia divertir-se com a natureza humana, reinventando figuras e lutas por liberdade e igualdade.