Reduzir demais as calorias pode estar associado a sintomas mais graves de depressão, sugere uma nova pesquisa publicada na terça-feira (3) na revista BMJ Nutrition, Prevention & Health.
O estudo analisou dados de mais de 28 mil adultos do National Health and Nutrition Examination Survey (Pesquisa Nacional de Saúde e Nutrição), que avaliou a qualidade da dieta dos participantes e seus sintomas de depressão.
De acordo com os dados, pessoas que seguiam uma dieta muito restritiva em calorias — especialmente homens e indivíduos com índice de massa corporal (IMC) considerado sobrepeso — tinham maior probabilidade de apresentar níveis mais altos de sintomas depressivos.
A qualidade da dieta também fez diferença. Pessoas que relataram uma alimentação com mais alimentos ultraprocessados, carboidratos refinados, gorduras saturadas, carnes processadas e doces tinham maior tendência a apresentar níveis mais altos de depressão. Já aqueles que seguiam mais de perto um padrão alimentar no estilo da dieta mediterrânea geralmente tinham menor risco de depressão, mostrou o estudo.
“Os resultados sugerem cautela com dietas excessivamente restritivas ou desequilibradas, especialmente para pessoas que já enfrentam estresse ou desafios relacionados ao peso”, afirma o autor principal do estudo, Venkat Bhat, psiquiatra, pesquisador clínico e diretor do Programa de Psiquiatria Intervencionista do St. Michael’s Hospital e da Universidade de Toronto.
Em vez disso, Bhat recomenda “optar por mudanças alimentares equilibradas e sustentáveis, que atendam às necessidades nutricionais e levem em conta os impactos psicológicos individuais, o que pode ajudar a minimizar os efeitos negativos no humor.”
Um achado diferente de estudos anteriores
Há algumas limitações a serem consideradas ao analisar os resultados. O desenho do estudo permite apenas identificar associações — não é possível afirmar, com certeza, que a restrição calórica cause aumento dos sintomas de depressão, segundo Bhat.
Além disso, o estudo se baseou em relatos dos próprios participantes sobre seus padrões alimentares, o que pode gerar erros, segundo Kary Woodruff, professora associada e diretora do programa de mestrado em Nutrição e Fisiologia Integrada da Universidade de Utah, que não participou da pesquisa.
“Eu posso acreditar que estou seguindo uma dieta com restrição calórica quando, na verdade, posso estar consumindo um excedente de calorias — não há como verificar se os participantes estavam realmente em restrição calórica”, afirma Woodruff.
O estudo é grande e controlou outros fatores que poderiam influenciar as associações encontradas, mas seus resultados contrastam com os de pesquisas anteriores sobre restrição calórica e depressão, de acordo com Bhat.
Outros estudos mostraram que dietas restritivas em calorias podem reduzir os sintomas depressivos, segundo Johanna Keeler, pesquisadora de pós-doutorado no King’s College London, que também não participou do estudo.
Uma diferença importante é que pesquisas anteriores, incluindo um artigo de 2023 coassinado por Keeler, analisaram dietas restritivas supervisionadas por profissionais de saúde.
“Portanto, esses achados podem refletir que fazer dieta sem acompanhamento, o que pode gerar deficiências nutricionais, não é benéfico para os sintomas de depressão”, explica Keeler.
Mais pesquisas e ensaios clínicos randomizados podem ser necessários para entender completamente como a dieta impacta a saúde mental, segundo Bhat.
Quando a restrição pode impactar na depressão
Existem várias razões pelas quais a restrição calórica observada neste estudo pode estar associada a efeitos negativos na saúde mental.
Estudos anteriores, incluindo os de Keeler, identificaram que dietas de baixa caloria, quando levavam à perda de peso em pessoas com sobrepeso ou obesidade, estavam associadas à redução dos sintomas depressivos.
Isso pode ser resultado de mudanças fisiológicas, melhora na mobilidade física ou aumento do retorno social positivo, explica Keeler.
“Começar uma dieta com restrição calórica sem obter perda de peso, ou passar por ciclos de perda e ganho de peso (‘efeito sanfona’), pode não gerar melhorias nos sintomas de depressão e, além disso, pode ser frustrante ou desanimador para a pessoa, levando ao aumento da depressão”, afirma Keeler por e-mail.
Quando a restrição calórica é muito severa ou quando a dieta não fornece nutrientes suficientes, podem ocorrer interrupções em processos físicos, levando a fadiga, problemas de sono e dificuldade de concentração, acrescenta Keeler.
Padrões de dieta extremamente restritivos também estão associados ao aumento da ansiedade e a um risco maior de desenvolvimento de transtornos alimentares, alerta Woodruff.
“A chave é avaliar o que — e quanto — está sendo restringido. Focar em um padrão alimentar saudável, que promova uma restrição calórica leve ou moderada, pode melhorar os sintomas de depressão e o humor, enquanto comportamentos extremos podem agravar a saúde mental, emocional e física”, afirma por e-mail.
Encontrando equilíbrio
Cada pessoa responde de forma diferente a uma dieta, e os resultados do estudo destacam a importância de recomendações alimentares personalizadas, que considerem não apenas a saúde física, mas também os fatores psicológicos, segundo Bhat.
Diante de tantas informações e conselhos conflitantes sobre nutrição e qual é a melhor abordagem, Keeler recomenda sempre buscar a orientação de um profissional de saúde antes de iniciar qualquer processo de perda de peso.
Mesmo para quem quer emagrecer, focar demais em uma forte restrição calórica pode não ser a opção mais sustentável, segundo Natalie Mokari, nutricionista na Carolina do Norte.
Em vez disso, ela recomenda pequenas mudanças em direção a um estilo de vida mais equilibrado.
Comece observando suas refeições, sugere Mokari. Seu prato tem uma fonte de proteína, carboidrato, gordura saudável e uma boa quantidade de fibras e nutrientes vindos de frutas e vegetais?
“Tente, primeiro, priorizar a adição dos nutrientes que você precisa. Depois, veja se há elementos que você pode reduzir ou eliminar”, orienta. “Talvez, se você estiver comendo de todos os grupos alimentares e fizer suas refeições de forma mais lenta, perceba que não precisa repetir o prato ou que não sente mais aquela urgência por uma sobremesa”, completa.
“Independentemente da perda de peso, melhorar a qualidade da alimentação pode gerar um impacto significativo na saúde geral e na qualidade de vida”, afirma Woodruff. “Considere trabalhar com um nutricionista registrado para entender qual é o padrão alimentar saudável mais adequado para você.”
Fonte: CNN Brasil