A Food and Drug Administration (FDA), órgão regulador de remédios nos Estados Unidos, aprovou nessa quarta-feira (18/6) o tratamento com injeções semestrais para a prevenção do HIV.
Desenvolvido pela Gilead Sciences, o Yeztugo, que usa o princípio ativo lenacapavir, teve eficácia de prevenção superior a 99,9% nos participantes que receberam o medicamento dentro dos ensaios clínicos.
O que é o HIV e sua diferença para a aids?
- O vírus da imunodeficiência humana (HIV) é um microrganismo que ataca o sistema imunológico. Quando não é tratado, ele pode evoluir para a aids (síndrome da imunodeficiência adquirida), que representa o estágio mais avançado da infecção pelo HIV.
- Embora não exista a cura para a aids, o tratamento antirretroviral pode controlar a infecção, permitindo que pessoas vivendo com HIV tenham uma vida longa e saudável.
- O tratamento correto pode fazer com que o paciente atinja a carga viral indetectável para o HIV, ou seja, tão baixa que não pode ser detectada por testes padrão. Nesse caso, a pessoa também não transmite o vírus.
- O HIV é transmitido principalmente através de fluidos corporais específicos, durante o sexo sem proteção, compartilhamento de seringas e de mãe para filho durante o parto, quando não for bem assistido.
- Beijos, suor, ou qualquer outra forma de contato íntimo, incluindo o sexo feito com preservativo, não transmite o HIV.
- O SUS disponibiliza testes rápidos para o HIV e também o tratamento preventivo com a profilaxia pré-exposição (PrEP), com o uso de um remédio diário. Procure um serviço de saúde e informe-se para saber se você tem indicação para PrEP.
A injeção semestral aprovada nos EUA é indicada para adolescentes e adultos sexualmente ativos. O método representa uma nova abordagem na luta contra o vírus, que há décadas desafia a saúde pública global por sua resistência à possibilidade de cura total.
O lenacapavir funciona como um inibidor do capsídeo, parte estrutural do vírus. Sem ele, o microrganismo perde as armaduras e encontra maior dificuldade para se replicar.
A aplicação semestral é apontada como uma alternativa mais eficaz que o comprimido diário da profilaxia pré-exposição (PrEP), usada atualmente como padrão-ouro internacional da prevenção do vírus e distribuído no Brasil pelo SUS.
“Uma injeção semestral poderia abordar significativamente barreiras importantes, como adesão e estigma, que indivíduos que usam PrEP oral diária podem enfrentar. Também sabemos que, em pesquisas, muitas pessoas que precisam ou desejam a PrEP preferiram doses menos frequentes”, afirmou o infectologista Carlos del Rio, professor emérito da Universidade Emory, em comunicado da farmacêutica.
Injeção é uma cura contra o HIV?
A injeção da Gilead não é uma vacina contra o HIV. Ela é apenas um remédio antiretroviral administrado para prevenir que o vírus se instale no organismo em caso de contato, de forma semelhante aos comprimidos da PrEP, que são tomados diariamente.
A eficácia é comprovada quando se toma duas doses anuais. Testes mais recentes feitos com a medicação indicaram que apenas uma dose já pode servir de proteção para o ano todo, mas em aplicações de injeções profundas, em um protocolo que ainda está sendo estudado.
Mais eficaz que a PrEP oral
Dois grandes estudos clínicos sustentam os resultados promissores. No primeiro, com mais de 2 mil mulheres na África Subsaariana, o lenacapavir reduziu as infecções em 100%. No segundo, entre 2 mil homens e pessoas de gênero diverso em todo mundo, a eficácia foi de 99,9%.
Para comparação, o Truvada, principal comprimido oral usado na profilaxia pré-exposição (PrEP), mostrou taxas de prevenção inferiores, ao redor de 95%, por conta das dificuldades da ingestão frequente. Entre os testados com a nova injeção, apenas duas pessoas foram infectadas. No grupo com PrEP oral, nove infecções foram registradas. Anova estratégia reduziu o risco em até 50 vezes, se comparada ao risco médio da população geral.
Alto custo pode limitar o acesso
Apesar da eficácia, o preço do medicamento preocupa. Estimativas sugerem que o valor anual do Yeztugo nos EUA, com as duas doses, pode chegar a US$ 25 mil (cerca de R$ 137,5 mil). Para uso como tratamento do HIV avançado, o preço de tabela do lenacapavir é de US$ 39 mil por ano (aproximadamente R$ 214,6 mil).
Ativistas e especialistas pedem a redução drástica dos preços. Analistas, como o infectologista Andrew Hill, da Universidade de Liverpool, estimam que o tratamento custe apenas cerca de US$ 25 (R$ 137,50) por dose. “Mesmo países ricos não conseguirão sustentar o uso amplo com preços tão altos”, alertou Hill.
Em resposta às críticas, a Gilead assinou acordos com seis farmacêuticas para produzir versões genéricas em 120 países de baixa e média renda. Essas versões ainda aguardam autorização regulatória e podem demorar a chegar ao mercado.
Resultados no Brasil
O Brasil participou dos testes com voluntários no Centro de Referência e Treinamento em IST/Aids, em São Paulo. A pesquisa incluiu também outros países da América do Sul, África e Sudeste Asiático, com incidência média de HIV de 2,3%.
Entre os usuários de PrEP oral, a taxa de HIV caiu para 0,11%. Já no grupo com lenacapavir injetável, a incidência foi ainda menor: 0,04%. Os efeitos colaterais mais comuns foram dor no local da aplicação, dor de cabeça e náusea.
No Brasil, ainda não há previsão para uma eventual liberação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para o uso do lenacapavir como preventivo ou como tratamento de infecções resistentes.
Em dezembro de 2024, o Ministério da Saúde defendeu uma aliança global para que o remédio alcance produção mais rápida.
“O alto custo do medicamento é um desafio, particularmente para países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos. Por isso, fomos enfáticos durante a reunião da necessidade da criação de uma aliança global para acesso ao lenacapavir”, afirmou Draurio Barreira, diretor do Departamento de HIV, Aids, Tuberculose, Hepatites Virais e Infecções Sexualmente Transmissíveis do Ministério da Saúde.
Fonte: Metrópoles