No último dia 6, o jornal O Globo publicou um editorial sugerindo que parte dos eventos da COP30, programada para ocorrer em Belém em 2025, fosse transferida para o Rio de Janeiro. A justificativa: a capital fluminense teria melhor infraestrutura e capacidade hoteleira para receber delegações internacionais. O argumento, embora revestido de pragmatismo, escancara uma visão centralizadora e elitista que há séculos marginaliza o Norte brasileiro.
A COP30 em Belém não é apenas uma escolha geográfica — é uma decisão simbólica e política. Realizar a conferência climática na Amazônia é reconhecer que a floresta é o centro das discussões sobre o futuro do planeta. Transferir parte do evento para o Sudeste é esvaziar esse gesto, como se a Amazônia fosse um tema a ser debatido à distância, sob o conforto dos salões do Sul maravilha.
O editorial ignora o valor do “lugar de fala”. Não se trata apenas de logística, mas de justiça climática e territorial. Belém não foi escolhida por conveniência, mas por urgência. É onde se vive a crise ambiental de forma cotidiana. É onde lideranças indígenas, ribeirinhas, quilombolas e populações urbanas sentem na pele os efeitos da destruição ambiental — e também onde se constroem alternativas sustentáveis com base em saberes ancestrais.
Sugerir que a solução está em “repartir” o evento com o Rio é, na prática, um ato de silenciamento. A imprensa do Sudeste, e particularmente O Globo, volta a reforçar a narrativa de que o Norte é incapaz de protagonizar os grandes debates nacionais e internacionais. Essa lógica não é nova — é a mesma que historicamente invisibilizou a Amazônia nos centros de decisão do país.
Sim, Belém precisa de investimentos e melhorias de infraestrutura. Mas esse é justamente o legado que a COP30 pode (e deve) deixar. Usar a precariedade como motivo para deslocar o evento é inverter a lógica da reparação. É como dizer que os espaços historicamente negligenciados devem continuar à margem — e que o debate sobre a floresta pode seguir sendo feito longe dela.
A Amazônia precisa ser vista, ouvida e vivida. A COP30 é a chance de colocar o mundo dentro da floresta, não de afastá-lo dela. E cabe à imprensa, inclusive a do eixo Sul-Sudeste, compreender que justiça ambiental também é reconhecer o direito de fala e de protagonismo de uma região historicamente esquecida.
Fonte: ParaWebNews