O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes votou pela condenação dos sete réus acusados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de propagar notícias falsas sobre as urnas eletrônicas. A Primeira Turma prossegue, na manhã desta terça-feira (21/10), o julgamento do núcleo 4, conhecido como o grupo de desinformação, no âmbito do processo referente à tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022.
Além da materialidade, está, segundo Moraes, relator do caso, comprovada a participação dos réus Ailton Moraes Barros (ex-major do Exército); Ângelo Denicoli (major da reserva do Exército); Giancarlo Rodrigues (subtenente do Exército); Guilherme Almeida (tenente-coronel do Exército); Marcelo Bormevet (agente da Polícia Federal); e Reginaldo Vieira de Abreu (coronel do Exército).
No caso de Carlos Cesar Moretzsohn Rocha (engenheiro e presidente do Voto Legal), Moraes o absolveu pelos crimes de golpe de Estado, dano qualificado e deterioração do patrimônio tombado. Mas o condenou por organização criminosa e atentado ao Estado Democrático de Direito.
Neste momento, vota o ministro Cristiano Zanin, para o qual a “organização criminosa armada tinha divisão de tarefas claras”.
Moraes começou a ler o voto, com a lembrança dos 13 momentos, entre 2021 e 8 de janeiro de 2023, destacados em julgamento que condenou Jair Messias Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão. O ministro lembrou que os atos levaram até a materialidade do crime, praticado pela organização criminosa, em 8 de janeiro.
O relator do caso ressaltou que o núcleo 4 atuou, com uso da estrutura do estado e ampla contribuição de integrantes do alto escalão, em conjunto com o núcleo 1, liderado por Bolsonaro, “que exerceu função de líder da organização criminosa”.

“Já houve comprovação da materialidade dos fatos, e a análise que deve ser feita agora é se, nos cinco atos praticados por esse núcleo, está contemplada a autoria desses réus da ação penal nº 2.694. Este é o núcleo da desinformação. A contribuição de cada réu para informação falsa e enganosa, o mesmo modus operandi das milícias digitais visando a ruptura institucional para um golpe de Estado”, afirmou Moraes no início do voto.
Segundo Moraes, “no âmbito da Justiça Eleitoral, ficaram constatados ataques sistemáticos contra as urnas eletrônicas. A tentativa era de desacreditar o resultado das eleições para impedir que o presidente democraticamente eleito ficasse impedido de assumir”.
“Eu chamo esse movimento de novo populismo digital. É uma falácia, uma mentira absurda, criminosa e antidemocrática dizer que essa utilização de ataque à Justiça eleitoral, de ataque ao Judiciário, de ataque à democracia, de discurso de ódio, que isso é liberdade de expressão. Isso é crime, tipificado no código penal”, destacou.
Sobre o réu Ailton Barros, Moraes entendeu que ele “aderiu e participou ativamente da organização criminosa”. “A conduta delitiva de Ailton está comprovada. A execução de sua condutas também. Ele integrou e promoveu a organização criminosa armada para a prática de todos os delitos apontados pela PGR”, ressaltou.
Quanto ao réu Ângelo Martins Denicoli, para o ministro, “fica claro, ostensivo que Denicoli participou da Abin Paralela”.
Para Moraes, as provas nos autos e a participação dele em live de 2022, com falas de Alexandre Ramagem, apontam que o major da reserva participou do grupo criminoso com sua expertise técnica. Ele contribuía com elementos para uma narrativa de desacreditar as urnas e o Poder Judiciário, segundo disse o ministro do STF no voto.
“Os elementos de prova trazidos nesses autos demonstram um vínculo estável e permanente do réu Ângelo Martins Denicole com os demais integrantes da organização criminosa na construção dessa falsa narrativa sobre as urnas. Ficou mostrado, que, além de fiscalizar e monitorar adversários políticos, produziu material para as milícias digitais propagarem desinformação.”
Para Moraes, houve a utilização da estrutura do Abin pela organização criminosa com a finalidade de divulgar pretensa vulnerabilidade nas urnas eletrônicas e da existência de fraudes nas eleições, com a clara finalidade de deslegitimar a Justiça Eleitoral, consequente, a Justiça Eleitoral. “Não há nenhuma dúvida da participação de Denicoli na participação da organização criminosa”, concluiu.
A expectativa é de que o julgamento seja concluído ainda nesta terça, com o apontamento de culpados ou inocentes e com a dosimetria, em caso de condenação. Se não houver tempo suficiente para a conclusão do julgamento, há previsão de sessão extra para esta quarta-feira (22/10).
Quem são os réus
A maioria dos réus do núcleo 4 é formada por militares. Entre eles, está o major expulso do Exército Ailton Gonçalves Barros. Segundo as investigações da Polícia Federal (PF), ele discutiu com o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, em dezembro de 2022, possível golpe de Estado em que as Forças Armadas tomariam o poder no país.
Os investigadores afirmam que a conversa foi registrada em três áudios, o que corrobora a denúncia apresentada pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, contra o major. Ailton foi candidato a deputado estadual pelo PL do Rio de Janeiro em 2022 e, durante a campanha, se apresentava como o “01 do Bolsonaro”, mas não conseguiu se eleger.
Outro réu é o major da reserva Ângelo Martins Denicoli, que, segundo a PF, atuou diretamente com o ex-marqueteiro de Javier Milei, presidente da Argentina, na tentativa de descredibilizar as eleições brasileiras e apontar supostas fraudes nas urnas.
O militar teria coordenado a produção e difusão de estudos que alegavam identificar “inconsistências” nas urnas eletrônicas do Brasil, em parceria com Fernando Cerimedo, poupado pela PGR na denúncia.
Também é réu o engenheiro e presidente do Voto Legal, Carlos Cesar Moretzsohn Rocha, responsável, a pedido do PL, pela elaboração de relatório em 2022 que apontava supostas falhas nas urnas eletrônicas.
Com base nesse documento, o partido de Bolsonaro defendeu que as alegações justificariam a anulação de parte dos votos computados.
O subtenente Giancarlo Gomes Rodrigues, militar cedido à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante a gestão de Alexandre Ramagem — já condenado no julgamento do núcleo 1 —, também é acusado. Segundo a PF, ele teria usado ferramentas da Abin, como o sistema First Mile, para disseminar informações falsas.
O tenente-coronel do Exército Guilherme Marques de Almeida comandava o 1º Batalhão de Operações Psicológicas do Exército, com sede em Goiânia. Ele aparece em um áudio divulgado pela PF sugerindo a necessidade de “sair das quatro linhas da Constituição” para viabilizar a tentativa de golpe de Estado.
O coronel do Exército Reginaldo Vieira de Abreu, conhecido como “Velame”, é investigado na Operação Contragolpe por integrar um grupo de militares suspeitos de planejar operação para sequestrar e matar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes.
Velame foi chefe de gabinete do general Mário Fernandes e, em conversa com o superior, defendeu ruptura democrática. “Quatro linhas da Constituição é o caceta”, disse.
O agente da PF Marcelo Araújo Bormevet, segundo as investigações, fazia parte de um núcleo paralelo da Abin, no qual atuava como servidor e secretário de Planejamento e Gestão.
Considerado um dos nomes de Alexandre Ramagem dentro da agência, Bormevet chegou a ordenar que um subordinado agredisse um assessor do então presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso.
Os réus são acusados de cinco crimes: organização criminosa armada, golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.
Depois de Moraes, na sequência, votam: Cristiano Zanin; Luiz Fux; Cármen Lúcia; e Flávio Dino, presidente da Primeira Turma.
Núcleos
Após a condenação dos integrantes do núcleo 1, o do ex-presidente Jair Bolsonaro, que teve pena imposta de 27 anos de prisão, ainda restam 23 réus a serem julgados por participação na tentativa de golpe. A expectativa do STF é de concluir todos os processos referentes aos núcleos até o fim do ano.
Além do núcleo 4, o núcleo 3 — conhecido como o dos “kids pretos” — tem julgamento agendado para novembro, dividido em quatro sessões, conforme determinação do presidente da Primeira Turma, ministro Flávio Dino.
O mesmo formato será adotado para o núcleo 2, cujo julgamento foi agendado para 9, 10, 16 e 17 de dezembro.
Fonte: Metrópoles