Que profundidade, em cada verso. Toda ideologia, toda moral, todo princípio e toda regra, todos caem pesados sobre e, a depender do intérprete ou experienciador. Certo e errado começam a perder contornos, todavia, quando vem uma ou outra exceção: risco de morte, risco de violação A ou B, risco de não cumprimento da literalidade de uma regra, risco de perda de poder, riscos…
E o muro representa esse limiar que vem com o bônus ‘se arriscar’. De um indivíduo a outro, a composição e a completude das regras autoimpostas ou recebidas divergem, no princípio, no meio ou no fim, conforme denota a cantiga.
E o que se diz sobre o que é bom ou mau também vai além de experiências impessoais ou regras sociopolíticas, porque, evidentemente, cada ser vem com sua carga socioemocional.
Choca quem entende – ou pelo menos tenta entender. O crivo moral deixa de ser enrijecido. Longe de se tornar um ser imoral ou amoral, mas preferindo buscar uma análise real, fática e multidisciplinar dos eventos que a própria jornada alcança, o ser inquiridor e julgador começa a querer se desentranhar de ideologias ‘suas’ e esse afastamento dói mais do que qualquer dor física, porque só aumenta, até que estabiliza, mas, nesse ponto, talvez o ser nem esteja mais nesta existência.
Nos versos seguintes, ouvia-se: “eu tenho a vida inteira e muito o que aprender, mas todos os meus problemas, você teima em resolver (…) só eu quem posso escolher a vida que eu vou viver (…) eu sei que é prova de amor, você não quer que eu jogue ‘pra’ perder. Deixa a vida me ensinar, eu vou provar ‘pra’ saber escolher (…)”.
Ali, extraem-se algo como os antigos métodos de controle e submissão por ‘proteção’ aos mais frágeis ou marginalizados e bem cabem e são bem-vindos, em certa medida, quando os frágeis ou fragilizados são cercados por incapacidade física e/ou psíquica.
Fora isso, imprimir a ideia de incapacidade é provar a inexistência de amor. Jogar o jogo da vida é, ao contrário do que se ensina, um jogo de perdas constantes e infindáveis, até que o que parece perda, passa a ser mais um degrau na evolução: um ganho!
Contudo, é inegável o sabor da vitória, porém ela não ensina a sabedoria da escolha, nem fortalece. Ela é fugaz e insuficiente, deixando um vazio de desamparo, momentos depois. Tem quem saiba desfrutá-la. Aliás, são de dar inveja -esse tipo de gente.
Os ganhos, os pódios e as conquistas exigem, requerem, com frieza, sempre algo a mais e o vencedor, sem perceber, empilha seus julgados exigentes e autoimpostos. E, claro, isso vem acompanhado com grandes expectativas do meio em que vive.
E, no ocidente, as coisas convergem à excelência contínua. Perfeito! Inclusive, no oriente também existe essa busca por evolução. O mar divisório entre o bom e o mal parece emergir das escolhas pessoais – que, ao fundo, quase nada tem de pessoais. As consequências delas, essas sim, são inalienáveis e intransferíveis. Quem garante? Umas Leis que o ser humano não pode tocar, nem alterar, a seu bel-prazer.
Jogar o jogo da vida e observar as regras, princípios e forças dominantes, nunca foi sobre o outro, seja ele seu subordinado ou superior, sempre foi sobre o jogador. Ele escolhe, consciente ou inconscientemente a jogada de superação ou evolução. Ele escolhe as perspectivas que aceita das circunstâncias que lhe ocorrem. Ele escolhe os karmas. Ele admite o dharma. Ele assume suas dívidas eternas. Ele trabalha sua autolimpeza.
Quem prefere jogar e escolher, assume o risco do erro e de suas consequências, mas sobe um degrau em seu próprio caminho eterno. A força, por regras ou poder, acumula cargas e ai de quem deseja subir se submetendo ao que nada tem a ver com seu compromisso eterno.
A música afirmava que a vida ensina e, prová-la, implica aprender e apreender além das expectativas – boas ou más. A diferença entre a percepção de estar estagnado ou movendo-se em frente vem, novamente, das interpretações e convicções, ou seja, dos pensamentos constantes e solidificados na mente – crenças, ideologias e normas.
Difícil aceitar, mais complicado ainda é compreender que o caminho de solitude é autogerido, por autorresponsabilidade única e exclusiva do vivente – independente do ofício ou do ócio. Ainda que se entenda cumprir tudo, ao pé da letra, o que aprendeu, ainda assim, as Leis eternas ressoam.
Não são boas ou más essas Leis, são exatas. Lembra: é dando que se recebe; é perdoando que se é perdoado; é morrendo que se vive a vida eterna. Nisso, está contido um pequeno arsenal de sabedoria das Leis.
É dando – em pensamentos e sentimentos- que se recebe, nessa ou em outra existência; é perdoando -soltando qualquer mal experienciado- que se é perdoado – o que sabe ou ignora ter feito; é morrendo – em crenças, valores, atos e omissões – que se vive a vida eterna – aquela em comunhão com a Inteligência Divina.
E daí vive-se o que é bom ou mau, certo ou errado, sem convencimentos externos, saltitando, em secreto, sua identidade com o Todo.