Certa vez, eu li: poesia é uma ilha cercada de palavras. Essa frase chamou muito a minha atenção. É lógico que a metáfora existente nela trouxe uma subjetividade imensa e me fez refletir bastante sobre o seu grande significado.
Logo entendi que um poema é composto de palavras com sentidos e significados. A palavra é a ponte que liga o poeta ao mundo, e a caverna que o mantém sã e salvo de si mesmo.
Certa vez, uma bela moça me perguntou:
— Como é namorar um poeta?
— Não sei, pois eu nunca namorei um. — Respondi em tom de brincadeira.
— Eu acho que namorar um poeta é passar a noite ouvindo poesia. — disse-me a bela jovem sorrindo.
— Bem, aprendi com “O Poeta” que cada homem tem o costume de falar de seu próprio ofício, e um poeta é um homem como os outros. O que o diferencia dos demais é a forma que ele vê as coisas, é a amplitude que ele tem no sentir do seu olhar.
— Acontece que, além de ser um homem como os outros, e sem deixar de sê-lo, ele tem isso de grave e especial que é ser um alguém a quem tudo concerne e de tudo tira o seu mel e seu fel.
— Aquelas pessoas que passam nas feiras empurrando os carrinhos de compras, o garoto na esquina com o seu caixote a espera de alguém para engraxar os sapatos, as pessoas atravessando o semáforo com os semblantes expressivos para mais um dia de trabalho, os próprios carrinhos de compras, o caixote do menino, os semblantes das pessoas no semáforo — tudo é matéria do poeta.
— Ao poeta tudo concerne, tudo é interessante, as folhas de uma árvore que o vento arrasta pelo chão, como o belo sorriso que salta de teus lábios. O que aconteceu é que tanto as folhas como o teu sorriso podem esperar muito tempo para entrar em um verso de um poeta, como podem entrar de repente.
— Você, com o seu lindo sorriso, pode ir aonde quiser ao sabor de suas fantasias. Porém, o poeta assim o crê: vê o toque das mãos de Deus na queda daquelas folhas ou no canto dos pássaros em uma manhã de primavera.
— Tudo se filtra na alma do poeta, inclusive você, a qual ele pode incorporar silenciosamente, e quando ele escrever: Na bela e clara manhã. Ele pode estar se lembrando do teu sorriso ou da tua voz serena.
— Bem! Eu não sei o que é namorar um poeta, mas, com certeza, agora, eu sei o que é ter um amigo poeta.
— Ops! Minha parada é a próxima. Beijos!
— Obrigado pelo sorriso, doce amiga.
Jorge A. M. Maia
ORATÓRIO
Canto uma bela canção para o silêncio
Sentado à sombra, no calor sem chuva
E ali, leio o diagrama das nossas almas
Onde o tempo espreguiçou-se comigo.
Desperto-me com o silêncio que chora
E sei que o que me molha vem de dentro.
Não faço barulho para não acordar a solidão.
E construo um amor autêntico em mim.
Minha alma, um santuário silencioso e fugaz
Que me resguarda do mundo opaco e sombrio
É lá que canto uma bela canção para o silêncio
Onde as palavras me mantêm salvo de mim.
Jorge A. M. Maia
CAMINHOS OCULTOS
Cometi a loucura de começar a viver:
Expulsei os deuses de seus templos
E também dos meus.
Atrás de mim avistei mil precipícios,
E em mim,
As possibilidades de eu ser eu.
Sou verdade que não serve aos deuses:
A vida sem loucura me deixou perdido.
Minhas roupas e máscaras são inúteis apelos.
Por isso, amigo, para ser eu mesmo,
Sigo
Nu e só. E prossigo
A esmo.
Jorge A. M. Maia
TEMA DE MIM MESMO
Onde tudo é poema, eu sou verso
Onde tudo é efêmero, sou o tempo
Onde tudo é mundo, sou universo
Onde tudo é farsa, eu sou lamento.
Onde tudo é imagem, sou espelho
Onde tudo é espelho, sou reflexo
Onde tudo é loucura, sou conselho
Onde tudo é côncavo, sou convexo
Onde tudo é dúvida, eu sou certeza
Onde tudo é simples, sou complexo
Onde tudo é tensão, eu sou leveza
Onde tudo é maldade, eu sou inverso.
Onde tudo é obscuro, eu sou clareza
Onde tudo é prisão, eu sou liberto
Onde tudo é silêncio, sou surpresa
Onde tudo for amor, serei reflexo.
Jorge A. M. Maia