(Autoria: Ronan Cesar Pires Ferreira – Analista IDAM – Síntese do TCC realizado sob a orientação do Dr. Diego Moura de Araújo – DIREITO – UNIFAP)
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou entendimento decisivo ao reconhecer que a chamada “pescaria probatória” — prática de busca indiscriminada de provas sem delimitação clara — viola o devido processo legal e compromete garantias constitucionais. A análise gira em torno do Recurso em Mandado de Segurança nº 62.562/MT, no qual foi anulada uma apreensão de dados realizada em uma empresa de gestão de abastecimento, ultrapassando o objeto da investigação. Ficou evidenciado que a ausência de fundamentação específica e a coleta excessiva de informações comprometem a validade das provas, reforçando a necessidade de rigor na definição dos limites das diligências investigativas.
A chamada pescaria probatória se insere em um cenário de tensão entre a busca da verdade real e a preservação dos direitos fundamentais. Apesar da importância da efetividade investigativa, o respeito ao contraditório, à ampla defesa e à inadmissibilidade de provas ilícitas deve prevalecer. A distinção entre a pescaria probatória e a serendipidade — descoberta fortuita de provas no curso de diligências legítimas — torna-se crucial: enquanto a serendipidade exige que a coleta de provas ocorra dentro dos limites autorizados, a pescaria probatória representa a violação desses limites em busca de elementos que nem sequer eram objeto da investigação inicial.
No caso analisado, a autoridade policial obteve mandado de busca voltado para documentos específicos, mas a operação acabou abrangendo todo o acervo eletrônico da empresa, incluindo dados de terceiros não relacionados à apuração. O STJ concluiu que a diligência não se limitou aos fatos investigados, configurando clara prática de pescaria probatória. Sem indícios concretos que justificassem a ampla apreensão, a Corte determinou a inutilização das provas obtidas, reafirmando que qualquer medida invasiva precisa ser proporcional, necessária e devidamente fundamentada.
A decisão fortalece a segurança jurídica no processo penal ao estabelecer que provas coletadas fora dos parâmetros legais devem ser descartadas. Em tempos de investigações que envolvem grandes volumes de dados digitais, o rigor na delimitação de mandados de busca se torna ainda mais necessário. A prática da pescaria probatória, ao desrespeitar os limites constitucionais, gera nulidades processuais, prejudica a credibilidade do sistema de justiça e compromete a eficiência investigativa. A reafirmação da proteção das garantias individuais diante do arbítrio estatal projeta um processo penal mais equilibrado e fiel aos princípios do Estado Democrático de Direito.