Tu sentes o aroma dos desertos?
Já friccionou tua pele na aridez da terra infértil?
Carregas por acaso em teu peito vasos sem veios,
secura completa e quebradiça de viga ressequida?
Vislumbrastes algum dia a imensidão luzidia
com ondulações arenosas cuja única referência
era o horizonte sem tréguas de raios de sol do meio-dia?
Por acaso teus pés já trilharam sobre torrões escaldantes
ou cascalhos refulgentes trincando qual dentes
em estalidos contínuos, passada a passada, inclementes?
Então, imagina, fotografa no imaginário de tuas retinas
crianças debruçadas sobre o sabre de bombas assassinas,
despejadas como se fossem fogos de festa junina ou luzes natalinas,
mas são, no entanto, o rastilho da ganância de mentes monetizadas,
de seres desalmados em busca de territórios para preencher o seu nada.
Não cabe em teu imaginário. Entendo.
Não obstante, isso está acontecendo.
Isso ocorre em várias partes do mundo.
Um mundo moribundo que não vê e não ouve.
E acontece sob a regência dos senhores do mundo e da guerra.
Aqueles que se consideram representantes de deuses e povos.
Tão pobres e miseráveis que precisam invadir outras terras,
destruir outros povos, acabar com a infância e a alegria.
Há desertos palpáveis, áridos e ardentes – queimam e derretem.
Mas muito mais implacável é o deserto que assola
os corações de humanos desumanizados, desconfigurados.
Este isola, flagelo anunciado.