No ultimo mês, decidi apresentar ao leitor, alguns autores, os quais considero a leitura de suas obras indispensáveis. Hannah Arendt, Ludwig Von Mises, Friedrich August Von Hayek, personagens que marcaram o seu tempo, com abordagens que permanecem atuais, mesmo tendo o mundo mudado tanto.
Agora, aproveito a oportunidade para apresentar a vocês, Jared Diamond, um renomado cientista, geógrafo, biólogo evolutivo e escritor norte-americano, nascido em 1937, em Boston (EUA), tendo se tornado mundialmente conhecido por suas obras que buscam explicar os grandes padrões da história humana a partir de fatores ambientais, biológicos e geográficos — e não apenas culturais ou políticos.
Dentre suas afamadas obras, a mais instigante, fala sobre a origem das desigualdades entre as civilizações, “Guns, Germs and Steel: The Fates of Human Societies” (Armas, Germes e Aço: O Destino Das Sociedades Humanas). Sua tese é simples. Defende, que as nações não se desenvolveram por causa de diferenças raciais ou intelectuais, mas por razões geográficas e ambientais. Em outras palavras, a sorte da história esteve escrita no solo, no clima e nas espécies disponíveis para domesticação.
Isso me chamou a atenção, quando fiz a seguinte indagação – se a geografia foi o fator determinante, por que o Brasil, um país de dimensões continentais e riquezas naturais incomparáveis, não seguiu o mesmo caminho dos Estados Unidos, uma nação que também nasceu de colônias europeias e compartilha extensões territoriais e potencial ambiental semelhante?
Assim, baseado nessa teoria e na formulação de uma resposta consciente e lúcida, decidi traçar um paralelo com o Brasil de hoje, para mostrar que ideias, instituições e culturas políticas moldaram os destinos das duas nações.
Para começar, Diamond explica que o desenvolvimento das sociedades foi condicionado pela “distribuição desigual dos recursos naturais e biológicos”. Povos que viviam em regiões férteis, com plantas e animais domesticáveis, puderam abandonar a caça e a coleta mais cedo. Esse salto permitiu o surgimento de excedentes agrícolas, divisão de trabalho, tecnologia e poder militar.
Foi essa base — e não a suposta “superioridade europeia” — que garantiu aos povos eurasiáticos as “armas, germes e o aço” com que conquistaram o mundo.
Seguindo essa lógica, a América do Norte e a América do Sul herdaram condições ambientais favoráveis. O norte temperado oferecia estações definidas, solos adaptados a diferentes cultivos e acesso mais direto à herança tecnológica europeia. O sul, tropical e exuberante, oferecia abundância, água à vontade, solos férteis, florestas densas e muitos minérios.
Porém, reduzir a diferença entre o Brasil e os Estados Unidos de hoje, apenas ao ambiente seria insuficiente. Já que os dois apresentam cenários semelhantes. O que realmente definiu os rumos de cada nação foi o tipo de colonização e as instituições políticas que nasceram de cada projeto histórico.
Quando ingleses e puritanos chegaram à América do Norte, buscavam algo mais que riqueza. Queriam liberdade religiosa, propriedade privada e autogoverno. Fundaram comunidades estáveis, criaram escolas, igrejas e assembleias locais. A terra era dividida em pequenas propriedades, e o trabalho livre — mesmo que coexistindo com a escravidão no sul — se tornou o alicerce cultural do país.
No Brasil, a lógica foi outra. A colonização portuguesa seguiu o padrão extrativista e mercantilista. A terra não foi distribuída para formar cidadãos, mas concedida em capitanias e sesmarias, para poucos. O objetivo não era povoar, mas “explorar”: retirar o pau-brasil, o açúcar, o ouro e, depois, o café, sempre para abastecer o mercado europeu.
Enquanto os colonos norte-americanos construíam uma sociedade civil autônoma, o Brasil consolidava uma cultura de dependência do Estado, da metrópole e, depois, das elites locais. A educação não era prioridade; a política era privilégio. Em vez de uma ética do trabalho e da responsabilidade individual, formou-se uma mentalidade, na qual o privado sempre serviu ao público.
O Brasil nunca transformou sua riqueza natural em capital humano e tecnológico. Ao longo dos séculos, desperdiçamos o potencial agrícola e mineral por falta de educação, inovação e visão de longo prazo. O Estado tornou-se o centro da vida nacional, não como promotor de liberdade, mas como distribuidor de favores. Assim, mesmo sendo um dos grandes celeiros que alimenta o mundo, ainda estamos muito a quem do nosso verdadeiro potencial.
Enquanto os Estados Unidos desenvolveram uma cultura de competição, mérito e autossuficiência, o Brasil se acostumou à dependência do poder político, às corporações e ao assistencialismo. O mesmo solo que nos deu abundância se transformou em justificativa para o imobilismo.
Nos Estados Unidos, o capitalismo nasceu de baixo para cima. A acumulação de capital veio do trabalho, da inovação e da iniciativa privada. Já no Brasil, o capitalismo foi de cima para baixo — uma concessão das elites agrárias (período café com leito), mais interessadas em manter privilégios do que em criar prosperidade compartilhada.
Por isso, mesmo com recursos abundantes, o país não construiu uma base sólida de instituições inclusivas. A economia brasileira alterna períodos de crescimento com ciclos de crise, porque nunca rompeu totalmente com o passado extrativista e clientelista. A mentalidade colonial sobreviveu: o lucro rápido, a burocracia, o desprezo pela ciência e a demonização do empreendedorismo.
Enquanto os EUA transformaram sua geografia em oportunidade, o Brasil transformou a sua em desculpa. O Norte aprendeu a usar o aço; o sul, a rezar pela sorte.
Mesmo com ambiente favorável, abundância de água doce, vasto território agricultável e matriz energética limpa, o Brasil está preso a um conflito ideológico que impede sua maturidade. Entre o estatismo e o populismo, o país oscila entre dois extremos: um Estado inchado que sufoca o indivíduo e um individuo que ver no Estado a alternativa de solução.
A lógica de “protecionismo salvador” substituiu a da produtividade. O investimento público se perde em burocracia e corrupção; o mérito é visto como privilégio. Enquanto os Estados Unidos consolidaram um sistema de valores liberais, que premiam o esforço, o risco e a responsabilidade pessoal, o Brasil ainda é refém da crença de que o Estado deve resolver tudo.
E, quando a política se torna religião, o progresso se transforma em promessa.
O Brasil não é pobre por falta de recursos, mas por falta de instituições sólidas e cultura de responsabilidade. O país precisa de uma revolução silenciosa, não nas ruas, mas nas ideias. Uma revolução que substitua o patrimonialismo pela meritocracia, o assistencialismo pela oportunidade, e a ideologia da dependência pela ética do trabalho.
Precisamos de uma educação voltada para a liberdade, não para a militância. De um Estado que sirva ao cidadão, e não o contrário.
De uma economia que premie quem produz, e não quem vive de conexões políticas. De lideranças que entendam que desenvolvimento não é distribuir riqueza inexistente, mas gerar prosperidade real.
Se Jared Diamond tivesse escrito “Armas, Germes e Aço” olhando para a América Latina, talvez concluísse que o destino de uma civilização não é apenas uma questão de geografia, mas de “coragem moral e intelectual”.
Os Estados Unidos transformaram a adversidade em oportunidade porque construíram um modelo de liberdade. O Brasil, com toda sua abundância, ainda luta para transformar potencial em projeto. E enquanto não rompermos com essa herança mental, seguiremos sendo o país mais rico entre os pobres — e o mais pobre entre os ricos.