A decisão do governo dos Estados Unidos de retirar o ministro Alexandre de Moraes, sua esposa e entidades ligadas à família da lista de sanções da Lei Magnitsky, anunciada em 12 de dezembro de 2025, reconfigura o tabuleiro político-diplomático entre Brasília e Washington. O gesto reverte a medida aplicada meses antes no contexto das tensões associadas ao julgamento e à responsabilização penal do ex-presidente Jair Bolsonaro, que, no debate público internacional, foi convertido por setores da direita brasileira em argumento para pressionar o STF via política externa norte-americana. A mudança, por si, não prova “conversão” ideológica de Trump, mas indica que o custo diplomático do conflito passou a superar seu benefício tático.
A leitura que ganha força em Brasília é a de um triunfo político de Lula: não necessariamente por “carisma”, e sim por capacidade de enquadrar o tema como matéria de soberania e institucionalidade democrática. A imprensa internacional registra que a reversão veio após uma conversa telefônica entre Trump e Lula e se insere em um movimento de distensão, também relacionado a fricções comerciais e tarifas. No campo governamental, Celso Amorim qualificou a revogação como “passo importante” para normalizar relações. Em termos de teoria política, trata-se de uma reposição do “princípio de não intervenção” como fronteira simbólica: quando o debate interno é externalizado como sanção extraterritorial, a política doméstica passa a ser arbitrada por terceiros.
O efeito colateral mais imediato é doméstico: a retirada das sanções esfria a estratégia de atores bolsonaristas que vinham apostando em Washington como alavanca de constrangimento institucional — dinâmica descrita, na cobertura, como um revés para Bolsonaro e, em especial, para Eduardo Bolsonaro, que fez lobby nos EUA por medidas punitivas. A mensagem política é dura: o “patriotismo” que se ancora em tutela externa tende a ser interpretado como dependência, não como defesa nacional. O ex-embaixador Rubens Barbosa, ao analisar o episódio, enfatizou que a relação bilateral é complexa e que a mudança não encerra a agenda pendente entre os países — justamente porque sanções não são diplomacia; são coerção.
Ainda assim, convém evitar triunfalismos. A reversão da Magnitsky não absolve automaticamente controvérsias sobre decisões judiciais, nem transforma antagonismos políticos em consenso institucional; ela apenas desloca o conflito de volta ao seu foro natural: a arena brasileira, com seus freios, contrapesos e disputas legítimas. O que Lula capitaliza — e é aqui que reside o ponto “acadêmico” do episódio — é o ganho de status negociador: ao repelir a lógica de chantagem e reduzir o espaço da “diplomacia paralela”, reforça-se a ideia de que soberania não é retórica, mas método. E, para a oposição que buscou a validação dos “impérios” contra as instituições nacionais, resta o dissabor estratégico: quando o árbitro externo muda de posição, fica exposta a fragilidade de quem apostou a política interna na vontade alheia.
Magnitsky em refluxo e o triunfo da soberania

