A divulgação dos diálogos obtidos pela Polícia Federal no celular do ex-presidente Jair Bolsonaro — incluindo trocas ríspidas com o deputado Eduardo Bolsonaro, pedidos de articulação internacional e tratativas com figuras de influência religiosa e política — projeta, à sombra do iminente julgamento por tentativa de golpe, um quadro de gravidade institucional que não pode ser banalizado. Os elementos coligidos apontam, segundo a PF e a imprensa, para estratégias de pressão sobre o Supremo Tribunal Federal, inclusive com coordenação de narrativas e busca de apoios externos, circunstâncias que, se comprovadas, tensionam princípios estruturantes como a independência dos Poderes e a autoridade das decisões judiciais.
No plano jurídico, os fatos narrados — diálogos para “brecar” o STF, tentativa de conferir roupagem político-diplomática a interesses pessoais e até a cogitação de asilo — devem ser cotejados com tipos penais de organização criminosa, abolição violenta do Estado de Direito, tentativa de golpe de Estado e obstrução de justiça, além do crime de coação no curso do processo na Ação Penal 2668, em trâmite no STF. A jurisprudência é constante ao repudiar qualquer ensaio de subversão da ordem constitucional, e o próprio relator remeteu o relatório final da PF à PGR para providências, em gesto de deferência às regras acusatórias. Tais condutas, se demonstradas, vulneram a cláusula pétrea do regime democrático (art. 60, §4º, IV, CF) e reclamam resposta firme dentro das balizas do devido processo legal — jamais por expedientes de exceção.
A linguagem pública de juristas e jornalistas reforça a gravidade do cenário. Celso de Mello, decano aposentado do STF, já advertira que o “golpismo” passou a ser defendido “explicitamente” por membros da família Bolsonaro, quando aventaram indulto ou anistia “nem que seja pelo uso da força”, reflexão que, embora anterior a esta leva de mensagens, se harmoniza com o teor das conversas reveladas. Analistas da CNN Brasil sintetizaram dez pontos em que os diálogos descrevem estratégia para pressionar o STF e operar apoio externo; reportagens do El País e da Agência Brasil registraram as mensagens de Eduardo chamando o pai de “ingrato”, a consulta a advogado ligado a Donald Trump e a hipótese de pedido de asilo a Javier Milei. Tais relatos oferecem lastro jornalístico para o debate público, sem substituir — é claro — o juízo probatório a ser feito em juízo.
A dialética entre liberdade de expressão e responsabilidade constitucional exige, aqui, a velha lição do Estado de Direito: ninguém está acima da Constituição. Se a prova pericial confirmar que houve tentativa de manipular o processo penal e de constranger a jurisdição constitucional, caberá ao STF — guardião da Carta — aplicar a lei com serena energia, preservando o devido processo, a ampla defesa e a presunção de inocência, mas também repelindo práticas que corroem a legalidade republicana. Como recorda Celso de Mello, a democracia não tolera “atalhos” autoritários; e como lembram jornalistas que cobrem o caso, os áudios e mensagens ora conhecidos são um fragmento do que será escrutinado em juízo. A sociedade tem o direito de ser informada, e o Judiciário, o dever de decidir com base nos autos e na Constituição.
Mensagens explosivas: fissuras no bolsonarismo às vésperas do julgamento
