O Brasil já foi chamado de “país do futuro”, mas parece ter estacionado no picadeiro do presente. Depois que ministro Alexandre de Moraes decretou a prisão domiciliar com uso de tornozeleira eletrônica do ex-presidente Jair Bolsonaro, sua trupe parlamentar resolveu transformar a Câmara dos Deputados num circo improvisado — e nem digo isso com ofensa aos circos, que pelo menos entregam espetáculo. Houve, pasmem, o ato sublime dos adesivos na boca, supostamente contra a mordaça do Judiciário. Só que, detalhe, os bravos defensores da liberdade tiravam o adesivo toda vez que queriam falar. É como protestar contra a obesidade numa churrascaria rodízio. Ortega y Gasset dizia que “a estupidez insiste sempre”; no Brasil, ela insiste, sorri para a câmera e ainda pede para ser filmada em close.
Mas o roteiro do pastelão não parou aí. Vieram as correntes no plenário. Sim, correntes! Um toque dramático, quase cinematográfico, digno de novela venezuelana. Só que, quando apertava o sapato ou batia a fome, lá iam eles: soltavam as correntes e passeavam pelo Congresso, celular na mão, rindo com os assessores. Diógenes de Sínope, o cínico, que viveu num barril para desafiar a hipocrisia da sociedade, morreria de rir — ou de vergonha alheia. Aqui, a rebeldia é um figurino que se veste para a foto e se tira no intervalo para o cafezinho. É a Hannah Arendt da banheira de espuma: a banalidade não do mal, mas da mentira preguiçosa, da encenação barata e grotesca
E não é só ridículo — é corrosivo. Ao transformar protesto em esquetes de TikTok, esses parlamentares matam o sentido do ato político. Montaigne já dizia que “a palavra é metade de quem fala e metade de quem ouve”, mas aqui a outra metade está surda, interessada apenas no próprio eco nas redes. Não é oposição, é stand-up de quinta categoria, com piadas internas que só a própria bolha entende. Eles não defendem princípios; defendem a novela do herói injustiçado, transmitida ao vivo para a plateia que ainda acredita que Bolsonaro é um mártir. O pior é que, enquanto eles fazem selfie com corrente, o país afunda nos mesmos problemas de sempre — e esses, sim, não têm roteiro nem trilha sonora.
Se o mundo é um palco, como escreveu Shakespeare, o Brasil virou a matinê permanente dos amadores. E, como toda peça ruim, a plateia começa a se cansar: primeiro boceja, depois levanta e vai embora. O problema é que aqui, quando o espetáculo termina, a conta sobra para todos nós. A democracia, essa senhora frágil que já apanha de todos os lados, não merece ser rebaixada a sketch de comédia física. Não dá para governar com correntes de papelão e fita crepe na boca. A política não é um carnaval fora de época, mas esses atores de araque parecem não ter entendido. Ou pior: entenderam muito bem e perceberam que, no Brasil, o ridículo ainda rende voto no circo dos que aplaudem a mediocridade. Mil vezes não!!!