A atuação recente da jornalista Malu Gaspar sobre fatos relacionados ao Ministro Alexandre de Moraes insere-se em um modelo de produção jornalística que privilegia a insinuação como técnica narrativa e a suspeição como efeito político. Não se trata de jornalismo investigativo no sentido clássico — aquele que, como defendia Pierre Bourdieu, submete o poder a um escrutínio racional e documentado —, mas de um jornalismo de ambiência, no qual o texto não prova, apenas sugere; não demonstra, apenas conduz. A dúvida passa a ser o produto final. Como alertou Bourdieu em Sobre a Televisão, quando a lógica do impacto substitui a lógica da prova, o jornalismo deixa de informar e passa a fabricar percepções, frequentemente dissociadas dos fatos.
Esse método ganhou centralidade no Brasil durante a Operação Lava Jato, quando vazamentos seletivos e delações mal verificadas foram convertidos em verdades midiáticas. À época, o punitivismo encontrou respaldo em um ecossistema comunicacional que tratava acusações como sentenças morais. Michel Foucault já advertia que o poder se exerce também pela produção de discursos que definem quem é suspeito, quem deve ser vigiado e quem merece desconfiança. O que se viu foi a construção de um regime de verdade jornalístico que antecedia o processo legal e pressionava as instituições. Quando o Supremo Tribunal Federal expôs os abusos, a engrenagem narrativa já havia produzido seus danos — sem que houvesse revisão pública consistente de métodos ou responsabilidades.
Hoje, esse mesmo padrão reaparece direcionado a Alexandre de Moraes. Incapaz ou desinteressada em enfrentar decisões no plano jurídico, a estratégia desloca o conflito para o campo simbólico. Reuniões institucionais são apresentadas como indícios; relações profissionais lícitas são reconfiguradas como potenciais escândalos; qualquer explicação é lida como culpa travestida de defesa. O leitor é conduzido, como diria Jürgen Habermas, a uma esfera pública degradada, na qual o debate racional é substituído por narrativas de deslegitimação. Não se argumenta contra decisões; tenta-se corroer a autoridade de quem decide.
Esse tipo de jornalismo é particularmente nocivo quando dirigido à Suprema Corte. Hannah Arendt lembrava que a corrosão da confiança nas instituições é um dos caminhos mais rápidos para o enfraquecimento da vida democrática. Ao lançar suspeitas sem lastro probatório sólido, o que se atinge não é apenas a biografia de um ministro, mas a própria ideia de justiça como instância racional e impessoal. Questionar o poder é indispensável; transformá-lo em alvo de campanhas de suspeição contínua é irresponsável. Jornalismo sério se ancora em documentos, contexto, contraditório real e disposição para corrigir rumos. Quando a insinuação vira método, a credibilidade deixa de ser atributo e passa a ser déficit. Não por ideologia, mas por abandono do rigor — e a história recente mostra que esse preço, mais cedo ou mais tarde, é cobrado pelo próprio público.

