A vida inteira, acredite, digo-lhe com toda honestidade e, também, envergonhado, perdoe-me, por pura imaturidade e ignorância, DEUS era uma figura distante para mim. Eu não o ignorava nem o deprezava, absolutamente, mas não era alguém com o qual me identificasse ou lembrasse, mesmo nas horas incertas, pois cético ou auto suficiente era como se eu simplesmente não precisasse de DEUS. Lamentavelmente, ELE parecia um figurante em minha vida. Assim passei boa parte de minha jovem existência imerso na soberba.
Tudo começou a mudar da noite para o dia ou da água para o vinho, fazendo juz ao meu nome, quando Saulo, o cobrador de impostos, de perseguidor de cristãos, passou a ser Paulo, o apóstolo de CRISTO, aquele que levou o SEU nome à Urbis et Orbis, expressão latina que significa Roma e o mundo, e aos poucos, quando como médico, passei a acompanhar o sofrimento humano mais atentamente à beira do leito, agora “com os olhos do coração”.
Como suportar tanta agrura? Apenas a intelectualidade e inteligência não conseguem aguentar a dor.
Assim, confesso, quando me vi impotente perante à dor alheia e à minha própria, com o tempo, em busca de milagre, humidelmente e com FÉ, então, supliquei por Deus.
Um dos singelos e mais importantes divisores de água para minha conversão cristã ocorreu apartir do seguinte e breve diálogo com minha mulher, ocorrido há mais de duas décadas, portanto por volta dos 40 anos, eu já homem maduro, mas de um profundo significado espiritual para mim, descrito a seguir nessa situação:
uma vez, eu triste em relação a um paciente com doença grave e em estado avançado, já fora de possibilidade terapêutica, num misto sentimento confuso de profundo desassossego e resignação, ao responder à Bernadete, minha mulher, que ele não tinha mais jeito, e que iria fatalmente morrer, ocorreu o seguinte e brevíssimo diálogo:
(Ao chegar em casa à noitinha, depois de um dia exaustivo de trabalho no hospital)
Paulo – estou muito triste e chateado! ‘Tô mal!
Bernadete – ‘tô vendo. Vai tomar o teu banho, comer e descansar. O que houve, afinal?
Paulo – já fiz de tudo, que a medicina poderia dar…o paciente vai morrer. Não tem mais jeito!
Bernadete – quem, exatamente? Teu paciente mesmo? Tem jeito, sim! Acreditas em Deus?
Paulo – claro! (Sem muita convicção) Amor, não se trata de milagres…aliás, o que não acredito. É que, simplesmente, não tem jeito mesmo!
Bernadete – tem, sim!
Paulo – ah, como?! Que história é essa?!
Bernadete – tem a VIDA ETERNA para quem n’ ELE crê. Reze meu, amor.
Bernadete é muito religiosa.
Aquela frase foi como um raio em minha vida. Parei num instante para refletir. Foi intenso. Parece improvável ou suspeito, mas ai começou o início de minha conversão para a FÉ em DEUS.
Um pouco anos antes ou quase coincidentemente, assisti um filme premiadíssimo do cineasta negro americano Spike Lee (drama/comédia-1989), Do the right thing (faça a coisa certa), quando eu já sensilizado por N.S. Jesus Cristo, isso mexeu muito comigo. A partir dessa época a frase “FAÇA A COISA CERTA”, insidiosamente, passou a nortear minha vida como se fosse a síntese dos DEZ MANDAMENTOS. Operou-se um milagre em minha vida: tornei-me um homem melhor. O resultado disso está aí. A minha vida tornou-se mais próspera, repleta de realizações pessoais, familiares e em paz.
Assim, minha vida passou a ter outro sentido, antes inimaginável para um descrente em Deus. Passei a experimentar uma riqueza de pensamento elevado, experiências, sensações e sentimentos e emoções positivas nunca antes experimentados, como nessa mensagem, que recebi ainda ontem pelo WhatsApp e que agora divido contigo. Parecia bem comum como muitas, que recebo. Não era. A msg de uma paciente (não identificada no texto) foi profundamente tocante para mim, a ponto de eu lagrimar de surpresa, com uma bola presa na garganta, em meio a uma vida médica tão desgastante e rotineira, onde elogios são poucos. Eis a mensagem:
“Boa tarde Dr Paulo, não fui mais me consultar por estar passando por uma depressão muito forte, quero agradecer pelo cuidado e ter me poupado do meu emocional ser abalado mais uma vez depois de tantas coisas que passei em julho mudei de cardiologista em … e ele solicitou aquele exame que o senhor havia pedido eco transesofágico com sedação então descobri tudo o que tenho nasci já com o problema os três profissionais que me atenderam foram maravilhosos vou ter que fazer um cateterismo primeiro depois a cirurgia fui aos dois médicos e falei que precisava me preparar para janeiro eles falaram se tiver uma que lhe chame pois é um grande profissional por ter pedido esse exame e saberá o que fazer eles são maravilhosos assim como o senhor sempre foi comigo fui ao que faz cateterismo e o cirurgião inclusive essa cirurgia ele faz também por laparoscopia o corte é menor porém a demora maior a outra forma é peito aberto que tudo sairá bem é tudo muito tranquilo.
Quando estiver me sentindo melhor, irei com o senhor.
Hoje eu entendo porque o senhor dizia que eu era um milagre.
Muito obrigada pela atenção e carinho que sempre teve comigo.
Lembro-me que o senhor até se emocionou quando fez um exame em mim e disse: tua fé é muito grande”.
Amigos, familiares, colegas, pacientes e desconhecidos, sabendo que escrevo, carinhosamente, pedem para que eu não pare com esse hobby. Não parerei; em verdade, eu preciso escrever. É minha catarse e “cachaça”.
“Não desejo as glórias literárias de um escritor, mas apenas o reconhecimento do paciente, de que no seu atendimento busquei fazer o meu melhor por ele”.