É inegável que o ser humano modificou o meio ambiente.
A cobiça – das práticas dos últimos séculos – modificou tanto o sistema global que rompeu com ciclos naturais, levando cientistas a buscar categorizar uma nova era geológica, batizada de Antropoceno.
O termo vem sendo debatido nos últimos vinte anos e se forma pela junção das expressões gregas “Anthropos” (ser humano) e “Cenos” (novo), com a ideia de novidade imposta pela ação humana.
É a disruptura, significando o rompimento do desenvolvimento natural, a inovação, a ocorrência de fato externo que altera o rumo natural, com a interrupção ou modificação substancial do processo tido como normal.
Essa disruptividade foi causada pela ação humana, de sorte que é responsabilidade humana a alteração dos ciclos naturais e funcionais do Planeta.
A primeira fase desse processo está na introdução maciça do uso dos hidrocarbonetos, notadamente do Petróleo e seus derivados, como fonte energética e matriz da produção industrial. Essa fase vai de 1800 até meados do Século 20, gerando brusco aumento da poluição, com concentração de dióxido de carbono e de materiais plásticos, inclusive as recentes derivações das micropartículas plásticas, na água e nos seres vivos.
A segunda fase vai de 1950 a idos de 2000/2015 e, chamada de Grande Aceleração, refere-se ao brutal aumento da população mundial (que, no período, dobrou) e do número de tecnologias poluentes, inclusive com produtos químicos de duração praticamente infinita (os chamados hidrocarbonetos, não solventes em água).
A terceira etapa é a que vivemos, na qual constata-se os reflexos que o obrar humano gerou no equilíbrio natural.
Em grande resumo, cabe considerar que o meio ambiente sempre seria equilibrado, como de fato sempre foi, sendo a ação humana, em escala global, o elemento capaz de interferir nesses ciclos naturais, a ponto de gerar desequilíbrio e certa (e incontrolável) reação em cadeia.
Uma dada interferência pode ser isoladamente considerada e não ter efeitos catastróficos, regionais ou globais, como ocorreria quando manada de animais interferisse em certo contexto, em ciclo migratório sazonal. Isso em tudo difere das ações permanentes, crescentes e reincidentes, sobre biomas, regiões, continentes, mares e oceanos, como o ser humano vem fazendo há tanto tempo.
Aqui não tratamos de bandeiras nesse ou naquele sentido, mas na constatação do óbvio, bastando ver a redução do número de animais, particularmente em certos locais. Dou testemunho de que há 30 anos viajava pelo Cerrado, mesmo das estradas assistindo a revoadas de pássaros – fenômeno, hoje, cada vez mais raro.
Além disso, reduziu-se o tamanho de peixes em certas regiões e até proibiu-se a pesca de espécies outrora abundantes, como o Surubim. Noutro foco, por mais que os temas sejam complexos aos nossos pensamentos mais comuns e cotidianos, é certo que aumentou a lista das espécies ameaçadas de extinção.
Algumas iniciativas são notáveis e o pequeno espaço deste artigo não comportaria tal abordagem. Uma delas é o investimento em novas tecnologias, como o carro elétrico.
Apesar das campanhas, do marketing e das pesquisas cientificas e tecnológicas, os carros elétricos não são autossuficientes e precisam consumir energia que tenha sido produzida por meio de usina nuclear, de usina termoelétrica, de usina hidrelétrica, etc. Além disso, a energia produzida, antes de ser consumida pelo motor elétrico, fica armazenada em imensas, pesadas e caras baterias de lítio, dentre outras.
Essas baterias são altamente poluentes – e pouco se fala nisso! A questão é que se aborda o funcionamento do motor a propulsão por energia elétrica e pouco se fala em como essa energia é armazenada ou chega ao veículo.
A poluição começa na sua produção, na mineração do Lítio, que consome grande quantidade de água, inclusive já afetando fontes naturais, por exemplo, nos aquíferos chilenos. Noutra frente, as baterias hão de ser descartadas um dia e… se constituirão em nova fonte de poluição.
Abordar partes do todo não facilita a compreensão do contexto.
Por este motivo, Carl Gustav Jung usou a palavra sincronicidade para indicar a relação não causal dos fatos e ocorrências – ou, noutras palavras, a coincidência significativa entre eles.
A banda The Police falava nisso, em 1983, na canção intitulada Synchronicity I, com versos sobre “princípio de conexão”, “invisível quase imperceptível”, “causalidade conectável”, “efeito sem causa” e “leis subatômicas”.
Tudo está interligado e fazemos parte desse contexto.
Não somos superiores e não podemos estar indiferentes ao que nos cerca. Estamos conectados a tudo: ao ar que respiramos, à água, às fontes de alimento, aos elementais, aos seres microscópicos, à energia do sol.
A forte nevasca, que atinge os EUA e afeta cerca de 200 milhões de pessoas – com temperaturas em torno de -30º (chegando até -55º) – e os rebanhos e plantações, interferirá na quantidade de alimentos em oferta e no preço dos produtos. Seria fato isolado, se não houvesse problemas tais no Japão e em outras áreas, contrastando com outros fatos afins, estes decorrentes de seca extrema, em outras regiões do Planeta, do já perceptível grave comprometimento de água doce potável, à iminente extinção do Atum, etc.
Enfim, o disruptivo ser humano bagunçou tudo e tanto e a tal ponto que a consequência do que se fez se volta contra si, legando-nos o imenso desafio de vencer a nós mesmos – e, isso, quando a humanidade chega a 8 bilhões de pessoas!
Urge que se pense – e se atue – nisso, globalmente, para que possamos nos desejar feliz ano novo nos próximos anos e não torcer para que o novo não seja pior que o anterior.
A propósito, desejamos que 2023 exceda às melhores expectativas e sonhos de cada um! Feliz Ano Novo!