O autor escavou histórias e contos, saudosos e fatídicos, de um povo trabalhador e batalhador, que ocupou a Amazônia, quando essa era uma das missões do Governo Federal.
O livro traz um dicionário “garimpês”, que, cujos vocábulos comuns à população do Tapajós, derivaram dos seus migrantes originários, os garimpeiros.
Entre páginas, vemos os curiosos causos. O n°1, “Quando um piloto manda o colega para o inferno”, o interlocutor disse que ele e Jorge, um sócio piloto, estavam puxando óleo diesel de Jacareacanga para um garimpo chamado XV de Novembro. O copiloto conta que estava aprendendo a pilotar e servia de garantia, posto que, além disso, também era mecânico.
Nas façanhas de idas e vindas, ocorriam umas ‘maluquices’. Numa viagem dessas, encontraram o Polia, que pede socorro, via rádio (instrumento de contato da época), comunicando que estava caindo. De fato, caiu. Nesse intervalo, relata que ouviu outro piloto responder “vai pro inferno”, omitindo socorro ao colega.
Cabrita, o contador do causo, relata que aquele evento marcou negativamente sua vida, pela ausência de empatia e pela dose de crueldade que ouviu. O acidente não resultou em morte, por obra divina, segundo o copiloto.
Sua perplexidade decorreu do fato de que os pilotos eram verdadeiros desbravadores do ar, numa época em que não havia tecnologia a bordo, a região era inóspita e as pistas, praticamente, não existiam, como se conhece hoje. Assim, um havia de se colocar no lugar do outro, discorre.
O livro dispõe histórias e entrevistas com ícones vivos, buscando ainda momentos e expressões de outras figuras lendárias, in memorian, deixando, inclusive, marcados os períodos em que o garimpeiro passou da legalidade ao crime, com as criações das Unidades de Conservação, na região.
Os atores e protagonistas, certamente, não se exaurem nas páginas escritas, conduzindo o imaginário do leitor às grandezas de coragem, humanidade e aventura, dos que ali habitaram, desde então.
Garimpando Histórias sintetiza a evolução das ocupações e os avanços decorrentes delas, desde os Mundurukus. Pontua uma fotografia dos garimpos do Tapajós e dos empreendedores da vez: os garimpeiros, pilotos, cantineiros, cozinheiras e meretrizes. Todos de ímpetos ímpares, para o crescimento e o fortalecimento do povo do Tapajós.
Entre o linguajar de historiador e o de repórter, Nazareno passeia na poesia. É rico em diversidade, do começo ao fim, cada parágrafo. Pela perspectiva de quem reside ou habitou por lá, há identificação cultural, verdade, sem contorno de vaidade, próprio de Nazareno mesmo.
Além de destacar casos inusitados e conhecidos, o aprendizado vem implícito ao longo das páginas. Fato inquestionável: homens que ergueram impérios e tiveram suas decadências. Além desses, as imagens falam por si: o duplo pouso é marcante.
Os entrevistados deixam seus traçados e ensinamentos, trazendo à tona trágicas e cômicas passagens de suas vidas pessoais e profissionais: “da vacora à exposição de tripas, na disputa por uma mulher” e “já morreu, a comédia do morto que ressuscitou, no Crepurizinho” são algumas delas.
São tantas instruções trazidas em narrativas curtas, que o justo seria reproduzir uma a uma aqui. Não falta coragem, obstinação, resiliência, humanidade e visão aos que suportaram a carga histórica e real dos iniciados no Tapajós.
Dentre suas obras, Nazareno pode fazer-se cumpridor de sua nobre missão com a “Garimpando Histórias”, porque, assim como os guerreiros do Tapajós -os garimpeiros- prestou-se pelo sonho de ser sua máxima expressão. Vale a pena ter a obra e conhecer um pequeno trecho da autêntica história de um povo forte.