Destituída da Presidência do Peru nessa quinta-feira (9/10), Dina Boluarte, de 63 anos, fez história ao se tornar a primeira mulher a ocupar o cargo, em dezembro de 2022. À época, ela prometeu acabar com a corrupção e restaurar a estabilidade do país, que estava em crise.
Contudo, as principais forças políticas do Parlamento apresentaram várias moções de destituição contra ela, alegando “incapacidade moral permanente” para exercer o cargo e enfrentar o crime organizado no país.
Quase três anos após assumir o poder após a queda de Pedro Castillo, Boluarte deixa o cargo com diversas investigações judiciais, com a desaprovação pública chegando a 93%, segundo uma pesquisa recente da Datum Internacional, e um país desgastado pela corrupção, uma crise de violência e desconfiança generalizada em suas instituições.
A saída marca mais um episódio de instabilidade no Peru, país que teve seis presidentes em apenas sete anos.
Carreira na advocacia
Dina nasceu em Chalhuanca, cidade localizada em uma região predominantemente indígena no centro-sul do Peru, onde o quéchua é uma língua comum. Suas origens rurais, que ela mesma enfatizou como parte de sua identidade política, permitiram que ela se conectasse com eleitores indígenas anos depois, durante sua campanha à vice-presidência ao lado de Pedro Castillo.
Antes da política, ela fez carreira na advocacia e como servidora pública. Formada pela Universidad de San Martín de Porres, em Lima, já liderou o Registro Nacional de Identificação e Estado Civil. O órgão é responsável pela identificação de todos os peruanos a partir da emissão de documentos.
A carreira na política é recente. Em 2018, Dina concorreu à Prefeitura de Lima, mas não garantiu o posto. Em 2020, tentou uma vaga de deputada nas eleições extraordinárias, também sem êxito.
A vitória apenas ocorreu em 2021, quando integrou a chapa do candidato de esquerda Pedro Castillo. No governo, ela assumiu a posição de ministra do Desenvolvimento e Inclusão social.
Entre as propostas durante a campanha estava a reforma da Constituição Política do Peru, de forma a implementar novo modelo econômico para o país.
Apesar de integrar o governo e ter sido eleita pelo Partido Libre, em entrevista ao jornal La Republica Dina afirmou não abraçar a ideologia da sigla. A declaração resultou em sua expulsão do partido.
Gestão de crise
Ao assumir a presidência do Peru, Dina teve que travar batalhas em duas frentes: apaziguar os legisladores que haviam deposto seu antecessor e acalmar os manifestantes indignados com a queda de mais um presidente.
A tentativa dela de caminhar em direção a um clima de normalidade incluiu o anúncio de eleições gerais para abril de 2026, com a promessa de que seu governo permaneceria “neutro e imparcial”.
No entanto, a percepção de inação diante do crime organizado e da violência, somada à promulgação de leis polêmicas no Congresso, motivou uma onda de protestos sem precedentes durante seu mandato.
A cidade de Juliaca, testemunhou um dos dias mais trágicos do início de 2023: 17 civis morreram em um único dia durante um protesto. Organizações de direitos humanos acusaram Boluarte de usar a violência do Estado para reprimir os protestos.
Supostos crimes
O Ministério Público peruano abriu uma investigação contra a presidente e outros ministros importantes pelos supostos crimes de “genocídio, homicídio qualificado e lesões graves” em conexão com a repressão.
Apesar da gravidade das acusações, Boluarte permaneceu firme: “Não vou renunciar. Meu compromisso é com o Peru, não com esse pequeno grupo que está fazendo o país sangrar”, declarou em um discurso televisionado.
Ela chegou a chamar os manifestantes de “terroristas” e sugerir, sem provas, que forças estrangeiras, incluindo ativistas bolivianos, haviam trazido armas para o país.
Protestos relevantes
Os protestos no Peru uniram diferentes setores do país: comerciantes, escolas, artistas, grupos musicais e, principalmente, motoristas, cobradores e passageiros do transporte público também se manifestaram, pois enfrentam ataques diários de assassinos de aluguel caso não paguem as tarifas exigidas por gangues criminosas.
O cansaço dos peruanos com casos como a investigação de suposto enriquecimento ilícito, incluindo o escândalo envolvendo seus relógios de luxo como supostas propinas, o que ela nega veementemente, e o suposto uso indevido de veículos oficiais para favorecer aliados políticos também geraram descontentamento.
Analistas apontam que Boluarte cometeu o erro de se distanciar de sua base eleitoral rural após assumir o cargo como a primeira mulher presidente do país.
Fonte: Metrópoles