O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), decidiu nesta segunda-feira (28) criar uma comissão especial para analisar o projeto de lei que concede anistia aos condenados pelos ataques golpistas de 8 de janeiro.
Em despacho, retirou a proposta de tramitação da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Casa —o texto seria votado na tarde desta terça (29). Na prática, o processo de discussão do projeto de lei começará praticamente do zero.
Agora, o próximo passo será cada partido indicar representantes para integrar a comissão, para que depois, ela seja instalada —não foi estabelecido um prazo para que as indicações sejam feitas. Segundo ato da Presidência, a comissão será formada por 34 membros titulares e 34 suplentes.
Um interlocutor de Lira afirma à reportagem que essa iniciativa faz com que o presidente da Câmara ganhe tempo, num momento em que o projeto de lei estava interferindo nas negociações para a eleição da Mesa Diretora, marcada para fevereiro do ano que vem.
Isso porque o PL, partido de Jair Bolsonaro, quer a aprovação do projeto de lei, enquanto o PT de Lula é contrário a isso. Hoje, são candidatos ao comando da Casa os líderes Hugo Motta (Republicanos-PB), apoiado por Lira, Elmar Nascimento (União Brasil-BA) e Antonio Brito (PSD-BA).
Lira tem atuado para que PT e PL anunciem apoio a Motta —o que até agora não ocorreu. Ele declarará apoio publicamente ao aliado na manhã desta terça, e também tratará do PL da Anistia.
Nas últimas semanas, o presidente da Câmara afirmou a aliados que pretendia resolver esse imbróglio acerca da proposta ainda neste ano, para evitar que o projeto contamine o debate nas negociações de sua sucessão à frente da Câmara. Ele se reuniu com o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, para tratar do tema.
Em reunião com a bancada do PT, Motta foi questionado por deputados sobre seu posicionamento acerca do projeto de lei e evitou se posicionar. Desde então, uma ala do partido passou a ter resistências ao nome do parlamentar.
Até mesmo aliados de Motta avaliam que esse é um tema espinhoso e que é preciso resolvê-lo, para evitar que isso prejudique a campanha do deputado. O Republicanos e o PP também farão atos em apoio a Motta nesta terça (29).
Há uma avaliação de parlamentares de que a comissão especial pode nem ser instalada, já que os líderes terão de indicar os nomes de seus integrantes. Uma liderança afirma que essa é uma matéria que confronta diretamente o STF (Supremo Tribunal Federal), e, dessa forma, pode causar um certo constrangimento aos líderes de indicar parlamentares.
No despacho de segunda (28), Lira diz que a proposta tem “complexidade e caráter multifacetado do tema” e que, diante disso, é desaconselhado uma “análise exclusiva no âmbito de uma única comissão de mérito”.
Dessa forma, define que a proposta deveria passar por outras cinco comissões temáticas da Casa, além da própria CCJ: “Administração e Serviço Público”, “Comunicação”, “Direitos Humanos”, “Relações Exteriores e de Defesa Nacional” e “Segurança Pública”.
Segundo o regimento interno, quando uma proposta é pautada em mais de quatro comissões, ela deverá tramitar em comissão especial.
Na CCJ, a proposta era relatada por Rodrigo Valadares (União Brasil-CE). Em seu parecer, ele ampliou o escopo da proposta e sugeriu perdão a todos os atos pretéritos e futuros relacionados aos ataques à sede dos três Poderes. Na avaliação de deputados governistas, o parecer tal qual estava abria margem para beneficiar o ex-presidente Bolsonaro.
A anistia é hoje uma das principais bandeiras de Bolsonaro. Declarado inelegível pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) até 2030 por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral, o ex-presidente foi indiciado neste ano pela Polícia Federal em inquéritos sobre as joias e a falsificação de certificados de vacinas contra a Covid-19.
Além desses casos, Bolsonaro é alvo de outras investigações, que apuram os crimes de tentativa de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado democrático de Direito, incluindo os ataques de 8 de janeiro de 2023.
Parte dessas apurações está no âmbito do inquérito das milícias digitais relatado pelo ministro Alexandre de Moraes (STF) e instaurado em 2021, que podem em tese resultar na condenação de Bolsonaro em diferentes frentes.
Caso seja processado e condenado pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito e associação criminosa, Bolsonaro poderá pegar uma pena de até 23 anos de prisão e ficar inelegível por mais de 30 anos.
Com informações de Folha de S. Paulo