Hoje, quanto mais plural, mais normal. E isso basta. Não é sobre dialetos e costumes ancestrais, mas sobre normatizar idéias, onde elas não surgiram, tradicionalmente.
Há espaços continentais ricos em tradição e cultura. Neles, o conceito de normalidade é marcado pela pluralidade milenar. Por exemplo, em muitas comunidades da África Subsaariana, a noção de tempo é fluida e difere radicalmente do conceito ocidental.
Em sociedades matrilineares como a Akan, em Gana, a herança é passada através das linhas femininas, o que é contrário ao que é considerado “normal” em muitas sociedades patriarcais.
Os latino-americanos também contribuem à diversidade, entre si. Aqui, o coletivismo é uma característica valorizada em muitas comunidades, nas quais a família é vista como um núcleo fundamental e interdependente.
Em certos grupos indígenas na Bolívia, o conceito de “any”, ou reciprocidade, é considerado normal. Trata-se de uma prática de mutualismo, em que os membros da comunidade se ajudam indistintamente.
Durkheim cuidou, assim, da diversidade pelo espectro da essencialidade. Para ele, a coesão social dependia do fortalecimento das diferenças sociais. Foucault endureceu um tantinho mais, realçando uma construção de controle social, por trás do conceito de “normal”.
Convenções sempre serão convenções, inclusive para aquele que assume ser contra elas. Afinal, o diferente também assume alguma premissa.
Homogeneizar faz mal à sociedade (Ok!). Diversificar, de igual teor, pode ser contraproducente: esquerda ou direita, hetero ou diversidade de gênero, ideologia A ou ideologia B (ao infinito…).
São perspectivas dualistas que incendeiam o palanque, os núcleos comunitários e o mundo e a única utilidade delas é, pasmem, normalizar, padronizar.
Ainda que os desavisados busquem “apreciar as diferenças (…) para começar a humanidade”, as forças ocultas (não evidentes) investem nas diferenças para inflamar e queimar os retardatários dos movimentos socioculturais.
E evidentemente os atrasos e as fixações em suas próprias tradições apartam uns dos outros. O globalismo impõe seu ritmo de interconexão e troca de práticas, valores e tradições.
Talvez, o padrão de normalidade requeira vozes de reconhecimento e respeito, inclusive pelos menos adeptos aos novos cenários.
De fato, o zelo precisa voltar-se aos que ficam silenciados, marginalizados, submissos. Vozes que calam vozes dominam o mundo, não importando a que título o fazem. Esse é um processo de normalização que leva (e sempre levou) à perda de traços culturais, línguas e tradições.
O normal é reconhecer a normalidade como construção, pela qual o equilíbrio é o progresso de todos os envolvidos. Se há pluralidade, deve haver aceitação da diferença.
Enquanto a aceitação permanecer tendo conotação de tolerância, haverá relutância. Havendo relutância, será percebido desgaste. Sendo percebido desgaste, não haverá coexistência pacífica. Logo, o que se tem é apatia cultural, na qual a diversidade é permitida, mas não é valorizada e compreendida, de verdade.
Muitas vezes, o que não é “normal” é exótico. Continua no campo da compreensão distorcida, da competição e da comparação entre as culturas.
Mais do que desafio, o equilíbrio pode apresentar-se em desaprender conceitos e apreender o mundo, mesmo que isso gere esforços à construção de novos valores.
Importa rememorar que não há nada novo, o que foi um dia, aqui, ainda é acolá. Deformar valores não representa conectar ou agigantar padrões culturais.
O plural e o normal bastam, quando não obrigam a normatização de idéias, ideologias e ideais, quando as tradições são capazes de se manter dignamente e quando a ética é a maior premissa assumida.
Só assim o normal não representa perigo e condiciona a evolução dos homens “normais”.