Contudo, o Parque Nacional das Montanhas do Tumucumaque, pela sua expressividade em volume de área, veio a causar reflexos positivos e de magnitude na preservação ambiental, além de influenciar no processo agrário ao forçar o redesenho do mapa do Estado do Amapá.
Pelo Decreto s/n. de 22 de agosto de 2002, o então Presidente da República Fernando Henrique Cardoso criou o maior parque nacional de florestas tropicais do mundo, com área total aproximada de 3.867.000,00 hectares, dos quais 3.715.534,70 estão localizados no Amapá, correspondendo a 25,9% da área do Estado. O restante avança sobre a área do Estado do Pará.
Sem embargo do necessário protecionismo ambiental mundial, em face da catástrofe que se anuncia ante a emissão de gases de efeito estufa, trata-se de manifesta interferência federal na política fundiária amapaense, partindo a iniciativa do Ministério do Meio Ambiente, em conjunto com ONGs verdes internacionais, da qual se queixaram os ambientalistas e políticos de estirpe, entre os quais o então senador Sebastião Bala e os deputados federais Fátima Pelaes e Antonio Feijão. As demais autoridades se deixaram emudecer por promessas vãs de Brasília.
O maior reclame da sociedade amapaense é que não houve estudos “in loco”. A eventual presença de posseiros na área não foi considerada e a doação da área pelo INCRA foi a medida compensatória de reservas legais não constituídas em outros projetos de assentamento em todo o País, consubstanciando-se aquelas terras do Tumucumaque em moeda de troca entre a União e aquela autarquia fundiária. Vide: “Dec. de 22/08/2002 (DOU de 23.08.02).Cria o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, no Estado do Amapá, e dá outras providências. […] Art. 3º As terras contidas nos limites descritos no art. 2º deste Decreto serão, nos termos da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, objeto de compensação de área de Reserva Legal dos projetos agro-extrativistas, de assentamento e de colonização, criados pelo INCRA”.
Todas essas circunstâncias e fatos trouxeram à tona o antigo desejo de o Estado do Amapá ter jurisdição sobre seu território. O Governo Estadual propusera ao MMA, IBAMA e COEMA, debalde, a inserção de um artigo específico no dispositivo de criação do PARNA Tumucumaque, a respeito das terras da União, como medida compensatória. Ei-lo: “Art. […] – As terras contidas nos limites (do Parque Nacional das Montanhas do Tumucumaque) serão compensadas pela transferência gratuita ao domínio do Estado do Amapá de todas as glebas atualmente matriculadas a nome da União Federal e administradas pelo INCRA”.
A situação atingia não só o Estado do Amapá, mas também os demais Estados Amazônicos, pois na Carta da Amazônia – “O clamor regional” – subscrita pelos órgãos de terra em 19/09/03, constou que “as dificuldades colocadas parecem, às vezes, se configurar num círculo vicioso: sem o plano de uso não é possível ter o domínio das terras e, por outro lado, sem ter o domínio das terras e, sobretudo sem o conhecimento detalhado da realidade fundiária, o plano de usos pode ficar na mera especulação. Esta situação não atinge somente o Estado do Amapá. Os demais Estados da Amazônia manifestam a necessidade da imediata recuperação, por parte dos estados que integram a Amazônia Legal, nos termos do decreto – Lei n.º 2.375 (art. 5º), da plena gestão de seus respectivos patrimônios fundiários, impedida, por quase duas décadas, pelo rigoroso processo de federalização de suas terras. Embora tenha cessado, no papel, há mais de 30 anos, o domínio da União sobre as referidas terras, a verdade é que essa devolução ainda não se operou”.
A criação do parque foi controversa, agravada pela falta de discussão com a sociedade amapaense. Ainda causa perplexidade a entrevista de Fernando Henrique Cardoso à mídia, ao manifestar-se quanto à resistência das lideranças locais: “Acredito na persuasão e eu tenho força de persuasão. Se não tiver persuasão, eu tenho o poder.” (SATO; WEBER, 2002, p. 1), revelando, ao invés de seu lado ambientalista, a faceta despótica que se desconhecia. Feijão, em entrevista concedida ao autor no dia 08/05/2009, atribuiu a decisão ao entusiasmo e ambição do ex-Presidente da República em comparecer à Cúpula Rio+10 em Johannesburgo (26-08-2002 a 4/9/2002) como criador do maior parque de florestas do mundo.
Para se ter uma noção mais exata do tamanho do PARNA Tumucumaque, a área transformada em Unidade de Conservação é quase igual à do Estado do Rio de Janeiro.
Enfim, criou-se praticamente um “Estado Ambiental” dentro do Estado do Amapá, um dos menores da Federação, sem quaisquer compensações pelos serviços ambientais que está prestando ao Brasil e ao mundo, pois sendo uma unidade de proteção integral impõe-se a “manutenção dos ecossistemas livres de alterações causadas por interferência humana, admitido apenas o uso indireto dos seus atributos naturais” (arts. 2º, VI e 8º, III, da Lei 9985/00).
O fator determinante da deflagração da polêmica foi a falta de discussão e compensações, pois a sociedade não se mostrou contra a constituição da unidade em si em face da consciência imperante da necessidade de reservas de florestas como mecanismo de sequestro de carbono, cuja regra encontra-se positivada no direito internacional com o Protocolo de Kyoto, constatável “primu ictu oculi” imprescindível para a mantença dos seres vivos no planeta.
E para o Amapá? Nada?
A bancada federal e a sociedade civil tem que cobrar do Brasil e do Mundo a compensação do crédito de carbono do Tumucumaque, mensurável em pecúnia, pois enquanto as chaminés dos Estados e Países desenvolvidos geram riquezas, a população do Amapá padece na pobreza.