A palavra escola se originou do grego schole e tinha – atenção – o sentido de ócio.
Contextualizada na época antiga, os trabalhos e as fadigas corporais geraram poucos momentos livres. Estes eram os tempos do ócio e do repouso, nos quais, os trabalhadores podiam se dedicar aos estudos e às coisas do pensamento.
De momento ou lugar do ócio, a palavra escola passou a corresponder ao local onde as pessoas iam para pensar e refletir, quando tinham tempo livre.
Hoje é o lugar onde os mestres ensinam.
Vivemos tempos curioso, onde grande parte do tempo livre é empregado não mais ao estudo e ao pensar crítico, como faziam e ensinavam os filósofos gregos.
Somos motivados a um tipo de ócio diferente daquele que estava agregado a origem da palavra escola.
Somos os influencers e os influenciados, nestes tempos modernos.
São imensas as transformações na vida social e não mais se vive como há cinquenta anos.
O futuro bate à porta e rasga a nossa previsão.
O nosso tempo livre não mais se dá com leitura e diálogos com os olhos nos olhos e as mãos dadas, a caminho do mar, sob o sol ou o luar.
Nosso lazer absoluto se foi dado o comprometimento com o aparelhinho que não sai de perto.
O investimento no futuro parece que, para muitos, se desintegrou a partir do momento em que curtidas – e o agir como influencers ou influenciados – deixaram a humanidade em outro patamar de ócio.
Para onde se olha se vê pessoas com os olhos grudados na tela.
A espécie humana conquistou um modo de estar em todos os lugares e, ao mesmo tempo, em nenhum.
Podemos estar na França, EUA, Marrocos ou Cancun e não estar em nenhum deles, se os nossos olhos e sentidos não estiverem focados no local físico e afogarem-se na tela do celular.
O ser humano passou a um tipo de onipresença, ao criar mecanismo que o coloque fora do local onde esteja.
É um tipo de alienação autoinduzida, motivada apenas pela necessidade de estar no grupo social e de ser por este aceito como indivíduo.
Os símbolos substituíram as ações historicamente demonstradoras do nosso sentimento.
Nesse rumo, parece que também se projeta a substituição do toque e do sorriso.
Se os músculos da face e do corpo complementam o ato de sorrir e procedimentos reais ou mera manipulação de filtros e afins, em aplicativos, são capazes de alterar fotos, isso significa que estamos ficando sem expressões faciais e, com o celular na mão, fora do lugar onde nosso corpo se encontra.
É a maior vitória da humanidade contra o ócio e, ao mesmo tempo, o seu maior incentivador.
Não há conexão com o ócio ou repouso dos gregos antigos, não há relação com o mergulho em si, com o autoconhecimento ou com o saber sobre as coisas.
Por vezes parece óbvia a resposta, mas a ideia está tão confusa que não conseguimos responder sobre “a cor do cavalo branco de Napoleão”.
Nossa capacidade crítica parece embotada, nossos argumentos se tornam rasos, como se nos limitássemos a responder sim ou não e seguir em frente.
Nossos diálogos com voz se substituem por redação pelo celular.
Se continuar assim, talvez no futuro tenhamos os dedos alongados, como os clássicos desenhos das mãos dos ETs.
No mesmo rumo, quem sabe não se atrofiarão as nossas cordas vocais. A utilidade futura dessa poderá ser semelhante ao que o Apêndice é para o nosso corpo, pois se o considera órgão “não essencial”.
Paradoxo da evolução. Estamos num momento de redefinição de rumos e estes seguem por estrada não devidamente clara e pavimentada.
Escrevemos e construímos o futuro, a cada fração de tempo dos nossos dias.
Não estamos aqui falando do marketing de influência ou do digital influencer, atividades contemporâneas fundamentais que, de certo modo, fazem o que outras ações assemelhadas fizeram no passado, nos programas de TV etc.
Sob outro foco, estamos como influenciadores do ócio, nos mobilizando ao mais eficiente desperdício do tempo.
Esse ócio é apenas mais uma peça no universo de controle do poder e pão e circo, herdado dos romanos.
Somos algozes e vítimas do mesmo processo que nos faz sujeitos ativos do que comentamos.
Com ou sem a dependência dessa influência coletivizada, a humanidade caminha para uma encruzilhada.
Viveremos melhor no futuro ou vagaremos como zumbis alienados pelas ruas em busca de mais estímulos sonoros ou visuais que no futuro venham a nos oferecer, sedutoramente?
Deixaremos de viver inesquecíveis momentos para realmente nos dedicar a eternizar postagens de momentos que mal soubemos valorizar?
Nos converteremos em tudo menos o que a evolução natural nos fez até aqui? 7Romperá a humanidade a sua relação com o humano ser animal que somos? Passaremos a habitar corpos e ser identificados por algoritmos?
Há quem fale que no Metaverso poderão ocorrer beijos e toques e isso nos leva à reflexão sobre o futuro? Nesse momento, deixaríamos de ser o que somos para ser o que?
Há vários estudos sobre o assunto e já se disse que “estamos criando uma geração de alienados” (Jornal Estado de São Paulo, 13.9.2016) e que a exposição precoce à tecnologia pode forjar essa geração.
A grande questão não é o que vemos hoje, pois é crível que não temos capacidade para enxergar todo o contexto. A ciência e os pesquisadores avaliam cada detalhe.
Apesar disso, as variações de personalidade e de influência do meio são capazes de oferecer uma infinidade de resultados e pesquisa dessa natureza levaria anos para refletir a realidade que apenas se antevê.
Difícil ver a vida melhor no futuro, como fala a canção. As coisas seguem tensas: a fome batendo à porta, a recessão mundial já nascendo, o conflito na Ucrânia envolvendo Otan, EUA, China e Rússia e o afastamento dos 1ºs ministros da Itália e do Reino Unido.
Considero que são tantas as situações preocupantes que por vezes dá vontade de se as esquecer e viver a vida em paz – quem sabe alienado na tela de um celular, embevecido com os sorrisos clareados nas fotografias, as imagens dos rostos com photoshop, as cores naturais aquecidas por ferramentas dos aplicativos e um mundo de felicidade e alegria, onde desfilamos o lado bom e hiperproduzido para passar a imagem de que estamos felizes, por fora.
Por dentro, as coisas nem sempre são o que as fotos representam e esse ócio nos consome o melhor de nós mesmo.