São Paulo — O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) denunciou pelo crime de tortura um delegado que foi flagrado em vídeo agredindo um advogado durante uma blitz de trânsito em Cândido Mota, cidade do interior paulista que fica a 440 km da capital. A sessão de violência foi iniciada por um policial militar, antes mesmo de a vítima desembarcar do carro.
Como o crime aconteceu
- O crime ocorreu em 1º de novembro do ano passado e teve início depois que o advogado Eduardo de Oliveira Leite não parou em uma blitz feita pelas polícias Civil e Militar na Rua Joaquim Galvão França, por volta das 22h.
- Ao ignorar o bloqueio, o veículo do advogado foi perseguido por uma viatura ocupada pelo delegado João Fernando Pauka Rodrigues, acompanhado de PMs em outro carro policial.
- Quando percebeu a aproximação do carro da Polícia Civil, o advogado acelerou, ao constatar que o delegado apontava uma arma em sua direção, segundo relatou às autoridades. Três tiros foram disparados — ninguém ficou ferido.
- Em depoimento, Eduardo Leite afirmou não ter parado porque nenhum agente de trânsito, ou policial, lhe sinalizou isso.
- O advogado só parou seu carro em frente de casa, momento em que foi abordado pelos policiais. Antes mesmo de desembarcar, um PM começou a agredi-lo com socos.
- Em seguida, Eduardo Leite foi retirado do veículo e agredido de várias formas na calçada pelo delegado denunciado. O policial chegou a chutar o advogado no rosto, quando ele já estava algemado e deitado no chão.
- Na ocasião, o delegado Rodrigues indiciou o advogado por embriaguez ao volante, resistência, desacato e tentativa de homicídio.
- Os crimes não foram acolhidos pela Promotoria, que os arquivou após ter acesso ao vídeo da ocorrência.
A defesa de João Fernando Pauka Rodrigues não foi localizada, O espaço segue aberto para manifestações.
A Secretaria da Segurança Pública (SSP) foi questionada sobre o caso e eventuais medidas tomadas contra o delegado. Por meio de sua assessoria de imprensa, a pasta afirmou apurar o caso, sobre o qual daria mais detalhes nesta terça-feira (21/4).
Arquivamento de inquérito
Além das imagens mostrarem uma dinâmica diferente da relatada pelo delegado, ele não apresentou provas que justificassem os crimes pelos quais indiciou o advogado.
A embriaguez ao volante, por exemplo, conforme destacada pelo MPSP na denúncia, foi refutada por um atestado médico, feito durante o atendimento da vítima após as agressões.
“Não só a Polícia Civil não produziu prova da embriaguez do conduzido como ele produziu prova médica, não contraditada e nem questionada”.
O MPSP também destacou não existirem provas de desacato ou resistência, por parte do advogado. A Promotoria ressaltou que a vítima foi agredida pelo delegado, quando já estava algemada e na presença de ao menos dez policiais, entre militares e civis.
João Fernando Pauka Rodrigues ainda indiciou a vítima por tentativa de homicídio, pelo fato de o advogado, segundo o delegado, ter movimentado sua caminhonete em direção à viatura da PM.
Esse argumento não convenceu o MPSP porque o carro da vítima avançou justamente após o advogado ter sido retirado à força do volante, por um dos policiais militares, conforme demonstrado no vídeo.
Mudança de versão
À Corregedora da Polícia Civil, o delegado mudou sua versão sobre o chute dado no rosto de Eduardo Leite. Na primeira delas, disse ter “tropeçado” na vítima e, na segunda, ter chutado o braço do advogado.
“As imagens mostram que o delegado de polícia João Fernanddo Pauka Rodrigues mentiu novamente”, reforçou a denúncia, acrescentando que “o quadro é de mentiras e mais mentiras, não permitindo um juízo seguro da veracidade dos fatos alegados pelos policiais que abordaram o investigado Eduardo de Oliveira Leite”.
Com base nesses apontamentos, o promotor de Justiça Marcelo Freire Garcia promoveu o arquivamento integral do inquérito policial, instaurado pelo delegado contra o advogado, e denunciou o policial civil pelo crime de tortura por submeter a vítima “a intenso sofrimento físico e mental, como forma de aplicar castigo pessoal”.
Fonte: Metrópoles