Num mundo acelerado e hiper produtivo, especialistas alertam para os riscos da exaustão coletiva e apontam a importância de resgatar o equilíbrio, o bem comum e a vivência plena.
Em sua obra Sociedade do Cansaço, o filósofo sul-coreano-alemão Byung-Chul Han descreve uma mudança profunda na forma como a humanidade organiza a vida e o trabalho. Se antes vivíamos sob a lógica da disciplina e da obediência, típica das sociedades industriais, hoje estamos imersos em uma cultura de desempenho, onde cada indivíduo é instado a ser seu próprio patrão — e seu próprio algoz.
Nada contra as ideias cada vez mais populares de empreendedorismos, todavia, a escalado do sucesso profissional e material está, sob muitos aspectos, tirando a paz, a tranquilidade, a aposentadoria por tempo limitado de serviço, obrigando as pessoas a viverem no volume máximo de estresse e de produtividade.
Produzir e consumir é preciso, viver não é preciso, plagiando um ditado português do século XV “navegar é preciso, viver não é preciso”, ideia que embalou a frenética caça ao Novo Mundo, que produziu, durante o Mercantilismo as Grandes Navegações.
Nesse modelo, não é o “outro” que nos oprime, mas nós mesmos, ao internalizar a exigência de estar sempre produzindo, melhorando e performando. O resultado é um cansaço difuso, silencioso, que se manifesta em quadros de ansiedade, depressão e burnout. Han observa que essa lógica não conhece limite: o indivíduo não se sente apenas explorado, mas insuficiente.
O preço da aceleração
Sociólogos como Hartmut Rosa reforçam esse diagnóstico ao falar de “aceleração social”: a compressão do tempo, o excesso de estímulos e a fragmentação da atenção corroem a capacidade humana de vivenciar o presente. A produtividade torna-se um fim em si mesma, e o descanso, um luxo culposo.
O que se perde, nessa engrenagem, é a noção de experiência profunda — aquilo que se vive com presença, significado e vínculo humano. Em vez de “estar no mundo”, acumulamos tarefas e dados. Em vez de partilhar, competimos.
O caminho do meio
Mas se a sociedade atual nos conduz à exaustão, onde encontrar saída? A filosofia oriental, o pensamento humanista e até as tradições espirituais convergem em um ponto: o equilíbrio. O chamado “caminho do meio” — nem o ascetismo rígido, nem o excesso compulsivo — é a trilha da lucidez.
Isso não significa recusar o trabalho ou a tecnologia, mas redefinir prioridades. É substituir a lógica da autoprodução incessante pela lógica do bem comum: reconhecer que a vida só faz sentido quando compartilhada e orientada por propósitos coletivos.
A experiência com o sagrado
O filósofo Walter Benjamin já dizia que a verdadeira experiência não é mera informação, mas vivência transformadora. Resgatar o sagrado da experiência significa dar valor ao tempo não produtivo: uma conversa despretensiosa, o silêncio, a contemplação da natureza, um momento de escuta real.
Nesse sentido, o “sagrado” não precisa ser religioso, mas uma postura reverente diante da vida, onde cada encontro, gesto e palavra carrega valor intrínseco. É a antítese da pressa: um olhar que reumaniza.
Conclusão
A “sociedade do cansaço” nos adoece ao nos fazer esquecer que somos finitos, vulneráveis e interdependentes. Retomar o caminho do meio é um ato de resistência, e resgatar a experiência como sagrado é um ato de cura. Afinal, só o ser humano que desacelera o suficiente para viver de fato é capaz de transformar o mundo para melhor.
E aqui deixo um convite a você, caro leitor, cara leitora: descanse mais, crie o hábito de cuidar de si mesmo, de si mesma, se presenteando com momentos de descanso, de andar descalço na terra seca ou molhada, de tomar banho de chuva ou de rio, de ser presença descansada para as pessoas que você ama. Saia do burburinho da sociedade alucinada e alucinante. Aposto que vai valer a pena.
Sociedade do Cansaço: entre a exaustão e o sagrado da experiência

Professora, historiadora, coach practitioner em PNL, neuropsicopedagoga
clínica e institucional, especialista em gestão pública.