O Círio de Nazaré é, antes de tudo, um caminhar. E, quando refletimos sobre sua essência, percebemos que essa caminhada não começou em Belém, nem em Nazaré, nem mesmo nas ruas de Belém do Pará, ou nas ruas de Macapá e nas ruas de Santana, mas no coração de uma jovem chamada Maria. O primeiro “círio” da História pode ser encontrado quando Maria, grávida do Menino Jesus, deixou sua casa e caminhou ao encontro de José, seu esposo. Naquele gesto simples e humano, carregava-se também a grandeza do cristianismo primitivo: a fé que se expressa nos passos, na confiança e na obediência à vontade de Deus.
Após o anúncio de Gabriel, um anjo que veio mostrar a Maria seu caminhar nas diretrizes do Eterno Pai, Ela, jovem e fiel aos desígnios do seu Senhor, caminha com Ele em seu Ventre santo, caminha para Ele, seu Cristo e Salvador e para seu próprio Magnificat. O Evangelista Lucas vai descrevê-la como a Mulher do silêncio: “Maria guardava todas aquelas coisas em seu coração”
Caminhar com Maria é, portanto, caminhar com a Sagrada Família. Nós, como povo de fé, repetimos esse gesto a cada outubro em Belém do Pará, mas, de maneira ainda mais profunda, somos convidados a repeti-lo todos os dias. Assim como Maria foi maior que Ester, que Rute, que Ana e tantas mulheres valorosas que a Bíblia nos apresenta, ela nos aponta sempre para o verdadeiro centro da História: seu Filho Jesus. Maria é Rainha do Céu porque foi serva de Deus, e sua grandeza não está em si mesma, mas em sua entrega total ao Cristo.
Nos dias atuais, é verdade que o Círio ganhou contornos turísticos, culturais e até comerciais. É uma das maiores festas religiosas do mundo, arrastando multidões que movimentam a economia local, o turismo, a arte, a gastronomia e as tradições populares. Contudo, seria injusto reduzi-lo a esse aspecto. O Círio é também uma oportunidade privilegiada de reflexão e de reencontro com a fé. Entre milhares de irmãos e irmãs que caminham, muitos o fazem em busca de sentido, outros se arrastam na contramão da História, seguindo falsos deuses, falsos gurus, falsos profetas e falsos messias. E, ainda assim, a presença de Maria é um farol que pode iluminar o caminho de volta para Cristo.
Na Igreja primitiva, a casa de Maria foi chamada de “Casa do Caminho”. Ali, sob seus cuidados, os primeiros discípulos de Jesus se reuniam para orar, recordar as Escrituras, dialogar sobre o legado de Cristo e se fortalecer na fé. Maria foi mãe da humanidade redimida, e continua a ser modelo para todo cristão. Contudo, não devemos adorá-la como se fosse uma deusa, mas imitá-la como discípula fiel, que se fez toda de Cristo.
Por isso, é Círio outra vez. Não apenas nas ruas de Belém, mas em cada gesto cotidiano em que decidimos caminhar para Jesus. Porque, como disse Pedro ao Mestre, “só Tu tens palavras de vida eterna”. O Círio é tradição, é cultura, é turismo, mas é, sobretudo, fé que se renova. Maria de Nazaré caminha conosco, para que também nós, como ela, possamos dizer sim a Deus e seguir sempre os passos do Salvador.