Como se sabe o discurso, na sua acepção mais corriqueira, é a exposição metódica sobre determinado tema que objetiva influir positivamente seus destinatários. Se porventura esse conceito fosse aplicado na avaliação dos discursos dos dois candidatos, dir-se-ia, sem qualquer circunlóquio, que Lula ganhou de lavagem. Enquanto Bolsonaro tentou sustentar a fama de mal, dando respostas diretas e ofensivas, Lula, por sua vez, procurava revelar que é preocupado com o bem estar social e se esmerava em produzir um semblante de pacificador social e de injustiçado. O resultado disso foi Lula influir positivamente no eleitor, consolidando os que já lhe são simpáticos e estimulando os indecisos a lhe seguirem.
A grande verdade, porém, é a questão em jogo é bem mais profunda. Ernesto Laclau em sua obra A Razão Populista leciona que o discurso constitui o território primário da construção da objetividade. Laclau despreza o conceito de discurso como exposição metódica de determinado assunto e o arremessa para o entendimento de que é um conjunto de elementos nos quais as relações desempenham um papel constitutivo. Saussure dizia que não existe elementos positivos na linguagem, mas unicamente diferenças. Dentro desse entendimento não houve a lavagem de Lula, mas propósitos diferentes nos discursos proferidos em que um alvitra um objetivo e o outro persegue diferente intento. Aqui mora o perigo.
Visto sob a perspectiva de Laclau, Bolsonaro em seu discurso deixou um duro recado para os brasileiros sustentado na crença de que tudo que até hoje produziu, mesmo as mais hediondas ações como o negacionismo na pandemia, reflete que objetiva construir um Brasil dentro desses parâmetros, alheio a qualquer repulsa social. Bolsonaro deixou claro que não governa para as massas. Suas ações compreendem uma visão de mundo em que a República não tem as ferramentas de pesos e contrapesos para evitar abusos nas funções estatais e que andar dentro das quatros linhas da Constituição – esta entendida como Carta Política do povo – é poder agir sem ser importunado por aqueles que têm o papel democrático de limitá-lo. Lula fez o discurso do triunfo da democracia, como expressão do povo, Bolsonaro proferiu o discurso do governo autoritário e severo. Esse é o ponto!