Essa é uma história de uma família portuguesa que, com certeza é semelhante a muitas outras histórias de imigrantes europeus para o Brasil do pós – segunda guerra mundial. À procura de trabalho, de dar um lar digno à suas famílias e em busca do recomeço no qual toda a Europa depois de 1945 e também antes e depois dessa data, nas revoluções que aquele continente viveu onde, seu povo foi o principal refém e a principal vítima.
Uma família em recorte histórico, muito simples, muito pequena, um João e uma Ester, unidos pelos sobrenomes de suas casas portuguesas Cunha e Carvalho, trazendo na bagagem além de muita coragem e determinação, características fortes ontem e hoje no povo português, trouxeram também seu maior tesouro: seus dois filhos: Fernanda e Fernando.
O ano era 1959, o Navio era o Hilary III da Companhia Inglesa Booth Line – que ofertou viagens entre os dois Países, Portugal e o Norte do Brasil – com escalas em Belém do Pará, Maranhão e Amazonas entre os anos de 1866 e 1961! (fonte: https://geneall.net/pt/forum) de bandeira inglesa e que transportava gente e coisas para outras paragens desse mundão de meu Deus.
O destino dessa família em específico nessa singela história foi Belém do Pará, a viagem de Portugal ao Brasil levaria 22 dias; João já veio contratado um ano antes, 1958, organizar tudo para, só um ano depois, 1959, mandar buscar seu pequeno grupo familiar.
O trabalho do João, chefe dessa família foi o mesmo que já havia aprendido em sua Terra Natal: tecelão. Em terras brasileiras, veio já empregado para trabalhar na Fábrica A Perseverança – de cordas, de algodão e sacos sarrapilheira, cuja matéria prima era a juta que vinha do Estado do Amazonas; de algodão. A Fábrica ficava na rua Quintino Bocaiúva, entre Municipalidade e Gaspar Viana, Bairro do Reduto.
João e sua esposa leal e guerreira, semelhante à Rainha Ester da história bíblica, era sua fiel escudeira, cuidando da casa, dos filhos e dos negócios que sempre foram a base de sustento desse pequeno grupo de pessoas. João prosperou e, em 1962 abriu seu primeiro Restaurante – Restaurante Girassol, na Rua 28 de Setembro esquina com a Travessa Quintino Bocaiúva, em Belém do Pará.
“Navegar é preciso, viver não é preciso” ditado português do século XV e que define bem o espírito aventureiro desse povo português. Com o João de Ester não foi diferente, quando o Restaurante Girassol estava consolidado, e sua esposa tocava o negócio, João comprou um caminhão, o F600 Ford e foi o pioneiro na estrada brasileira Belém – Brasília fazendo fretes até o Estado de São Paulo.
Uma característica desse povo antigo e desbravador, desde o Império Romano, as invasões muçulmanas e toda a saga das grandes navegações que essa gente ibérica iniciou no Ocidente do mundo, descobrindo na prática náutica que a Terra era redonda como suspeitavam os estudiosos da época, num período histórico senhorial feudal cristão católico, onde, estudar poderia ser considerado ato pecaminoso e perigoso, pois, a primeira e a última palavra era sempre da Igreja.
Todavia, o tempo não pára, não para não e a evolução é uma constante, graças à Deus! Um homem italiano, da Casa de Florença, Américo Vespúcio singrou esses mares conhecidos para outros dantes navegados e constatou que de fato a Terra era redonda e deu à volta do ocidente ao oriente em barcos construídos pelos conhecimentos da Escola de Sagres; e o País que reuniu as condições necessárias para iniciar as grandes navegações foi Portugal. Primeiro com as Caravelas, movidas por suas velas ao sabor do vento e da coragem que define a saga portuguesa e espanhola, depois seguida pelos outros reinos europeus. Primeiro a Inglaterra, Holanda, França etc.
A matriarca dessa típica família portuguesa foi com seu João construindo restaurantes, pousadas e hotéis no seu novo lugar chamado Belém do Pará, onde, pela influência da cultura luso brasileira não estavam sozinhos, não; muitos outros patrícios seus construíram a Belém desde a colonização das terras do Império Português até a formação da Primeira Província Imperial do Grão Pará e Maranhão, até os dias atuais
A mescla dessas duas culturas é sentida até os nossos dias . Reduto, citado aqui em meu título, é um bairro de Belém tradicional e histórico que fica no centro velho da cidade de Belém e foi o berço dessa família portuguesa e de muitas outras famílias que de lá vieram, também navegando mas não mais em Caravelas mas em navios cargueiros e comerciais movidos a Vapor, na era do Carvão como combustível disponível pela tecnologia daquela época.
Ninguém a não ser essas quatro pessoas tão comuns e tão únicas podem explicar e tecer comentários das dificuldades que enfrentaram na convivência com um povo tão parecido, porém tão distinto em caráter e formação. Família para o povo português até hoje é sinônimo de sagrado e de singularidade; não existe na mentalidade portuguesa o tão conhecido por nós brasileiros “jeitinho”; são pessoas de hábitos milenares e de posição clara como o mar de Nazaré; talvez o “pavio curto” nas discussões se aproximem de nós, seus descendentes brasileiros.
Nos dias atuais do século XXI, onde Portugal se transformou na “Porta” para os brasileiros que querem imigrar para a Europa, os imigrantes brasileiros que não se planejam, não assistem os Youtubers que explicam o cotidiano daquele povo e daquele País, irão sentir na pele o peso de uma cultura milenar e da burocracia portuguesas. Experimente assistir os vídeos da brasileira Juba Santos sobre Portugal ou do brasileiro Kaike do canal viainfindas, dentre outros.
Na Belém do século XX, ter empresa e ter família muitas vezes era defendido à bala, quando a situação não dava pra resolver numa boa e amigável conversa. Tanto João quanto sua Ester eram gigantes na defesa de seu núcleo familiar e ai de quem tentasse machucar seus amores: Fernanda e Fernando!
Numa festividade católica na cidade de Belém, na malhação do Judas, onde, Portugal havia ensinado e doutrinado o Brasil oficial Católico, as tradições só podiam ser as mesmas. Algumas pessoas da convivência com o casal João e Ester se reuniram e fizeram quatro bonecos de pano, onde acompanhava o título: Pistoleiros do Reduto, cada boneco tinha um revólver, que descrevia bem como João e Ester e seus filhos defendiam sua cultura, sua família, seus empreendimentos em terras distantes.
E aqui caro leitor, cara leitora, se estão esperando um desfecho julgador, uma análise sociológica ou antropológica acerca das atitudes desses personagens tão singelos, enganam – se, o objetivo é contar sobre essa família vibrante que, deu origem a três gerações de seu clã, hoje como nas origens portuguesas, se desdobra e se compõe e recompõe nos dois Países, nos dois povos; haja vista que seus filhos e netos prosperaram e habitam o novo e o velho mundo.
Se enraizaram não como a saga de João e Ester no início, mas com as armas do conhecimento e do empreendedorismo, da ciência médica, do Direito, das Relações exteriores, da Docência e do comércio foram escrevendo sua história de força, fé, coragem, determinação e amor, muito amor por sua fé cristã e por seu sangue lusitano e brasileiro.
Uma casa portuguesa, com certeza, defendida no trabalho e na pistola se preciso fosse mas com toda a energia do amor pelos seus na raiz de toda essa linhagem biográfica.
A saga dos pistoleiros do Reduto que nada mais eram do que um clã de gente forte, corajosa, apaixonada pela vida! Uma casa portuguesa, com certeza!
PISTOLEIROS DO REDUTO

Professora, historiadora, coach practitioner em PNL, neuropsicopedagoga
clínica e institucional, especialista em gestão pública.