As águas turvas do majestoso Rio Amazonas derramam-se em prantos ante tua partida. Há nelas um cheiro de lágrimas pela insaciável saudade de tua presença. Lembram-se de ti com os braços elegantemente cruzados, o tronco ereto e olhar fixo em suas maresias como se quisesses captar a mensagem divina que trazem consigo. Havia uma cumplicidade entre teu olhar e o movimento frenético das águas. Como musas divinas inspiravam tua degustação dionísica com teu indefectível filé a Carlos Gomes. Ficavam, como meninas suburbanas nas janelas, observando o homem-mistério que parecias ser. Viam-te trajando um manto franciscano em tons marrons e uma sandália que transbordavam humildade. Intuías, com as vestes imaginárias, ser um portador dos recados dos anjos. Jamais cogitavam de tua partida, por isso choram como infantes.
As maresias altas eram uma espécie de sorriso produzido com esmero para te reverenciar. Ouviam – com nitidez irreparável – os teus poemas mudos, todos decassílabos com rimas perfeitas. Sentiam-se ao mesmo tempo musas e estrelas das tuas inspirações mediúnicas. Quando caminhavas, meu querido Wagner Gomes, as águas iludidas do majestoso rio deduziam que era um desfile para os deuses numa apresentação curta e festiva em reverência a tua timidez. Imaginavam-te solitário a catar na ternura das águas um sentido para a existência. Para elas, tua imagem denotava seres uma síntese perfeita dos pensadores que tanto admiravas e citavas. O espelho de tua mente refletia nas águas e agitava as ondas como a provocar o entusiasmo pela vida.
Nas margens do Rio Amazonas ecoam com tua páscoa os murmúrios silenciosos das águas, sussurrando uma despedida trasmudada em poesia, numa elegia singela entrelaçada com a melancolia das correntezas. Wagner Gomes, tu que eras a própria essência contemplativa das águas, agora és parte delas, um mistério que se dissolve na vastidão dos seus caminhos. As musas que te rodeavam, invisíveis e ao mesmo tempo palpáveis como o próprio rio, doravante, choram tua ausência, pois perdidas estão sem a tua voz calibrada que ecoava em poemas decassílabos na quietude das marés ao som da Marselhesa que tanto amavas: “Aux armes, citoyens, formez vos batailons, marchez, marchez!”
Descansa, ó navegante das águas do espírito, pois tua jornada entre nós foi como um poema que se escreve na eternidade das correntezas. Tu és parte do rio, como o rio é parte de ti, entrelaçados na teia infinita que conecta todas as coisas. Que as estrelas e as musas te recebam, pois, na tua passagem, o mundo perdeu um pouco da magia, do encanto e dos mistérios, mas ganhou um eco eterno nas águas que um dia te abraçaram como seu próprio filho. De quando em vez, por favor, Ó navegante, venhas em forma de brisa acariciando nossas almas órfãs, tristes, pois estaremos de braços elegantemente cruzados, com troncos eretos, altivos, fingindo ser tu nesta existência efêmera e cheia de ilusões.
Elegia ao Wagner Gomes (quando as maresias choram)
