A norma no artigo 7°, realiza a divisão das unidades de conservação em dois grandes grupos de proteção integral e de uso sustentável.
O primeiro desses dois grupos é o das “Unidades de Proteção Integral”, sendo possível apenas o uso indireto dos recursos naturais e de atividades como educação, pesquisa cientifica e turismo. Nesse grupo, pelo artigo 8°, encontram-se: a Estação Ecológica, a Reserva Biológica, o Parque Nacional, o Monumento Natural e o Refúgio da Vida Silvestre.
O segundo grupo é o das “Unidades de Uso Sustentável”, em que é permitido à presença e atividade humana, em que se busca compatibilizar a conservação com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais. Nesse grupo de acordo com artigo 14, fazem parte: a Área de Proteção Ambiental, a Área de Relevante Interesse Ecológico, a Floresta Nacional, a Reserva Extrativista, a Reserva de Fauna, a Reserva de Desenvolvimento Sustentável, e a Reserva Particular do Patrimônio Natural.
De acordo com o artigo 2º, XVIII, da Lei nº. 9.985/2000, a Zona de Amortecimento (ZA), também chamada de Zona Tampão Circundante, é o entorno de uma unidade de conservação, onde as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a unidade, deixando claro seu objetivo de amortecer ou mitigar os impactos.
O artigo 25, §1o e 2o,, salienta que as unidades de conservação, com exceção da Área de Proteção Ambiental e da Reserva Particular do Patrimônio Natural, as demais devem possuir uma Zona de Amortecimento, sendo que essa obrigação cabe ao órgão responsável pela administração da unidade que estabelecerá normas específicas regulamentando a ocupação e o uso dos recursos da Zona de Amortecimento, sendo que esse ato poderão ser definidas no ato da criação ou posteriormente (art. 25, § 1o e 2o,).
Vê-se, portanto, que esse artigo, flexibiliza a norma e estabelece o instituto discricionário (oportunidade e conveniência), quanto a criação da Zona de Amortecimento, fator que estabelece conflitos com áreas de entorno, com terras indígenas, terras quilombolas, assentamentos rurais, propriedade privada, uma vez que haverá necessidade de terras para essa Zona de Amortecimento quando não implantadas no ato da sua criação, que poderá estar afetada por terras privadas e públicas.
No artigo 27, § 1o, a norma descreve que as unidades de conservação devem dispor de um Plano de Manejo com sua Zona de Amortecimento incluindo medidas com o fim de promover sua integração à vida econômica e social das comunidades vizinhas, contrariando o dispositivo acima elencado.
O artigo 36, da norma, trata do licenciamento ambiental com significativo impacto ambiental, em que há exigência de Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Monitoramento Ambiental (EIA/RIMA), em que nesse caso o empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e a manutenção de unidade de conservação do Grupo de Proteção Integral; e no seu § 3o, mesmo que a unidade de conservação não pertença ao Grupo de Proteção Integral, expande essa compensação ambiental quando esse empreendimento afetar unidade de conservação específica ou sua Zona de Amortecimento
O artigo 46, aborda sobre a execução de projeto de saneamento básico e de infraestrutura urbana que serão realizados em unidades de conservação ou na sua Zona de Amortecimento, da exigência de prévia aprovação do órgão responsável por sua administração, inclusive da exigência de EIA/RIMA se for necessário; e no Parágrafo único do mesmo dispositivo, esclarece que mesma condição se aplica à Zona de Amortecimento das unidades do Grupo de Proteção Integral, bem como às áreas de propriedade privada inseridas nos limites dessas unidades e ainda não indenizadas.
O artigo 49, Parágrafo único, enfoca que a Zona de Amortecimento das unidades de conservação de proteção integral, uma vez definida formalmente como zona rural, não pode ser transformada em zona urbana; e no artigo 57-A, estabelece que o Poder Executivo estabelecerá os limites para o plantio de organismos geneticamente modificados nas áreas que circundam as unidades de conservação até que seja fixada sua Zona de Amortecimento e aprovado o seu respectivo Plano de Manejo.
O Decreto n.º 4.340, de 22 de agosto de 2002, que regulamentou a Lei nº. 9.985/2000, contém somente dois dispositivos tratando de Zona de Amortecimento, em que no artigo 11, Parágrafo único, aponta que na ausência de mosaico, o corredor ecológico que interliga unidades de conservação terá o mesmo tratamento da sua Zona de Amortecimento. No artigo 19, VIII, descreve que há necessidade de manifestação do órgão gestor da unidade sobre obra ou atividade potencialmente causadora de impacto na unidade de conservação, em sua Zona de Amortecimento.
Analisando a lei do SNUC e seu decreto regulamentador, a norma trás dificuldade para os administradores das unidades de conservação, visto que a mesma estabelece dois institutos distintos conflitantes, como Corredor da Biodiversidade e Zona de Amortecimento, chegando em determinados momentos estabelecer funções idênticas e até da dispensa da obrigatoriedade no ato da sua criação das unidades de conservação das implantações dessas áreas.
Desta maneira, a lei deveria deixar claro que Mosaico de Unidades de Conservação, são as junções dessas Unidades; que os Corredores da Biodiversidade unem essas unidades com o fito de permitir o livre deslocamento de animais, a dispersão de sementes e o aumento da cobertura vegetal, reduzindo os efeitos da fragmentação dos ecossistemas ao promover a ligação entre essas áreas de proteção e de conservação, fato que favorece e permitir o fluxo gênico entre as espécies da fauna e flora contido nesses biomas; enquanto a Zona de Amortecimento, elas não fazem parte das Unidades de Conservação, são as áreas de entorno, que tem a finalidade de proteger e conservar esses limites, ao estabelecer uma área protetiva com regramento para as atividades econômicas, como também previnem a fragmentação e o efeito de borda.
Vale ressaltar, que além da norma do SNUC, tem a Resolução CONAMA n.º 428, de 17 de dezembro de 2010, que tem o mesmo objetivo do artigo 36 da Lei nº. 9.985/2000 e do artigo 9, VIII, do Decreto n.º 4.340/2002, da anuência do administrador da Unidade de conservação para atividades que possam afetar a Zona de Amortecimento e do EIA/RIMA, entretanto ela inova visto que na norma e no seu regulamento não há referência quanto a faixa para Zona de Amortecimento, assim a resolução em tela salienta que se a Unidade foi estabelecida sem a definição de Zona de Amortecimento, empreendimentos com capacidade de impacto significativo ao ambiente deverão respeitar uma faixa estabelecida de 3 km de distância e serão obrigados a obter o licenciamento.
Vale ressaltar que a faixa protetiva da Zona de Amortecimento pode ser estabelecida no momento da criação da unidade ou em momento posterior pelo órgão administrador da unidade. Aqui que as normas do SNUC, na aplicação do instituto discricionário causa conflitos e judicialização.
Desta forma, seria mais apropriado, tanto do ponto de vista ecológico quanto institucional, que a Zona de Amortecimento fosse definida nos seus estudos técnicos da criação da unidade de conservação, pois infelizmente essa flexibilização das normas favorece que somente na elaboração dos estudos do Plano de Manejo da unidade seja detectado a necessidade da criação da Zona de Amortecimento, por existir atividades produtivas, e até outros modelos de uso sustentável, de proteção integral, terras indígenas, terras quilombolas, e assentamento rurais.
Portanto, o objetivo primordial da Zona de Amortecimento, é de estabelecer uma Zona Tampão Circundante, principalmente resguardando esses beneficiários de possíveis conflitos de atividades antrópicas, e também evitar que essas unidades de conservação sejam afetadas significativamente nos seus atributos.
A Zona de Amortecimento é importante, além das unidades de conservação, para terras indígenas, terras quilombolas, e até mesmo para assentamento rurais, quando fazem divisas com esses modelos de destinação de terras públicas.
A título de ilustração, vejam o que pode causar a implantação de uma Zona de Amortecimento TARDIA.
No Estado do Amapá, desde 2017, vem ocorrendo Acordo institucional envolvendo MPF, INCRA, IEPE, SEMA, AMAPÁ TERRAS, e FUNAI, visando uma redefinição no Perímetro da Perimetral Norte, que envolve Assentamento Rural Federal da Perimetral Norte e Aldeia Indígena Waiãpi, por inexistir entre ambas uma ZONA DE AMORTECIMENTO.
Após decisões institucionais esses órgãos definiram que os lotes de números 62 a 76 e de números 162 a 176 do assentamento rural federal, envolvendo 30 lotes de famílias de agricultores, serão afastados dos limites das terras indígenas waiãpi.
Vejam que tudo isso poderia ter sido evitado se no ato da implantação do Assentamento Rural Federal e da Aldeia Indígena fosse criada uma Zona de Amortecimento Circundante.
Essas famílias de agricultores estão recebendo NOTIFICAÇÕES do INCRA para deixar de explorar a área que ocupam e de retirar todas as benfeitorias nelas existentes no prazo de 30 (trinta) dias a contar do recebimento da NOTIFICAÇÃO DO INCRA.
Como CONTRAPARTIDA o INCRA, se compromete a reassentar todos beneficiários que se encontram assentados fora dos limites originais do assentamento para outros lotes dentro do perímetro resultante do acordo, tão logo sejam identificados lotes sem ocupação ou sejam demarcadas novas parcelas no assentamento. Essas informações estão contidas nas NOTIFICAÇÕES.
Deixarei de realizar análise técnica e jurídica quanto ao aspecto dos direitos dessas famílias de agricultores que em todo processo não foram ouvidas, visto que o objetivo foi de demonstrar que a própria lei do SNUC, seu decreto regulamentador, e a resolução Conama, não deveriam deixar nas mãos dos administradores das Unidades de Conservação aplicabilidade do instituto discricionário (oportunidade e conveniência), o ato de criar Zona de Amortecimento e mesmo Corredores da Biodiversidade, inclusive o Plano de Manejo.
Deveriam torná-la vinculante essa exigência, que evitariam conflitos, inclusive institucional e consequentemente privado, sem olvidar que as Auditórias do TCE e do TCU, nas Unidades de Conservação da Amazônia Legal, concluíram que não existem documentos de gestão, dentre eles: Zona de Amortecimento, Corredores da Biodiversidade, Mosaicos, e pasmem Plano de Manejo e Conselho Gestor instituído. Só Jeová na causa.